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Real liderará ganhos cambiais até 2035, projeta Goldman Sachs

Relatório do Goldman Sachs aponta real como destaque global entre emergentes e detalha fatores que impulsionam o potencial de valorização

Moedas de reais - 15/10/2010 (Foto: REUTERS/Bruno Domingos)

247 - As perspectivas para as moedas de países emergentes voltaram ao centro do debate financeiro internacional. Um estudo do banco americano Goldman Sachs projeta que o real brasileiro ocupará a liderança global em ganhos cambiais ao longo da próxima década, impulsionado pela combinação entre valorização e juros elevados.

O relatório “FX in 2035 — Finding fair and getting there”, divulgado pelo O Globo, aponta que o real tende a superar seus pares até 2035. O documento também destaca o peso colombiano e o rand sul-africano como candidatos a retornos expressivos, beneficiados pelo atual ciclo global de estratégias de carry trade.

A análise do Goldman Sachs sugere que o ambiente internacional favorece moedas com taxas de juros mais altas, uma vez que investidores buscam ampliar ganhos ao aplicar recursos nesses mercados. Esse movimento já está em curso desde 2024 e, para o banco, deve ganhar força nos próximos anos. Segundo Teresa Alves, estrategista sênior de câmbio para emergentes, o comportamento recente não é fortuito. "Os mercados tendem a supercompensar os riscos de inflação e de perda nas moedas emergentes, o que ajuda a explicar por que as estratégias de carry trade seguem entregando retornos acima do previsto pelos modelos tradicionais", afirma. Ela destaca ainda que esse padrão está relacionado ao chamado forward premium puzzle, fenômeno econômico que contraria teorias tradicionais ao mostrar retornos maiores em moedas com juros elevados.

O estudo ressalta que, quando a inflação não ultrapassa as expectativas, parte do prêmio de risco embutido nos contratos de câmbio se transforma em ganho adicional. Para o real, a projeção é de retorno total de 118% em dez anos — resultado de uma valorização estimada em 8,5% somada a um ganho de 109% via juros. Para o rand sul-africano, o total previsto é de 60%, combinando apreciação de 16% e carry de 44%.

O banco também avalia que essas moedas podem se aproximar de seus valores justos até 2035, movimento favorecido por um dólar menos valorizado e por melhorias fiscais e de produtividade em economias emergentes.

Cautela com previsões de longo prazo

Apesar do otimismo do Goldman Sachs, especialistas ponderam que projetar o câmbio em um horizonte tão longo envolve riscos significativos. Para Gabriel Giannecchini, analista de multimercados da ASA Investments, embora o cenário seja plausível, ele considera o prognóstico “coerente, mas excessivamente otimista”. Segundo ele, “já estamos em um ambiente de forte carry trade, e isso ajuda moedas como o real e o peso colombiano”. Ainda assim, o analista alerta para a dificuldade de sustentar esse ciclo por uma década, diante das fragilidades estruturais dos emergentes, como crescimento baixo e contas públicas delicadas.

Giannecchini acrescenta que boa parte da valorização vista recentemente nessas moedas decorre da fraqueza do dólar, e não de avanços internos. “A alta dos emergentes reflete muito mais um movimento global do que conquistas locais”, explica. Segundo ele, mudanças na política monetária americana podem rapidamente alterar a direção dos fluxos financeiros. O analista lembra ainda que esses mercados são mais sensíveis a períodos de estresse. “Essas moedas são as que mais se valorizam quando o cenário é favorável, mas também as que mais sofrem nas reversões de apetite ao risco”, afirma.

Incertezas e impacto da política econômica

O professor André Duarte, associado da PUC-Rio e ex-operador de câmbio, reforça o grau elevado de incerteza que cerca projeções tão distantes. “Mesmo modelos complexos costumam falhar na previsão do câmbio, porque o mercado reage a fatores que vão muito além dos fundamentos”, afirma. Ele lembra que “o próprio Fed gastou fortunas nos anos 1990 tentando prever moedas, e quase todos os modelos davam errado”.

Duarte ressalta que decisões políticas e fiscais ganharam peso crescente na formação dos preços das moedas emergentes. “Vivemos um mundo em que as decisões políticas pesam mais sobre os ativos do que há 20 anos”, diz. Para o Brasil, o professor enxerga potencial de valorização, mas com condicionantes. “Se o país avançar em um ajuste fiscal consistente, há espaço para valorização, mas se a incerteza fiscal continuar, o real dificilmente manterá esse fôlego".

O próprio Goldman Sachs reconhece riscos relevantes para o cenário traçado. Teresa Alves observa que choques negativos nos preços das commodities poderiam reduzir a força das moedas emergentes, especialmente em países exportadores como Brasil e África do Sul. “O momento é positivo para os emergentes, mas não livre de riscos”, afirma. Segundo ela, a sustentabilidade da valorização depende de disciplina fiscal e estabilidade institucional.

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