“É uma tristeza e uma indignação permitir que isso aconteça”, diz filho de Portinari
João Cândido Portinari lamenta roubo na Biblioteca Mário de Andrade e cobra preservação do patrimônio cultural
247 - O roubo das gravuras de Cândido Portinari e de Henri Matisse, apresentadas na Biblioteca Mário de Andrade, acendeu um alerta firme de João Cândido Portinari sobre a vulnerabilidade na proteção do patrimônio artístico brasileiro. A avaliação foi feita ao Brasil Agora, da TV 247, em entrevista na qual o filho do pintor detalhou o impacto da perda e contextualizou a relevância histórica das obras subtraídas.
Ao conversar com o Brasil Agora, João Candido Portinari contou que tomou conhecimento do crime por meio da imprensa. Ele classificou o episódio como um choque e associou o roubo a um quadro mais amplo de falta de estrutura e de cuidados permanentes com instituições responsáveis pela preservação da memória cultural do país.
Patrimônio sob risco e ausência de comunicação com a família
Ao comentar o roubo das cinco gravuras de seu pai — pertencentes à edição bibliófila de Menino de Engenho (1959) — o pesquisador ressaltou a gravidade do ocorrido e a falta de interlocução das autoridades com a família do artista. Ele contou que não foi contatado pela polícia nem pela Biblioteca Mário de Andrade após o crime: “Não me procuraram. Quem me procurou foi a mídia. A polícia não. E nem a biblioteca também não me procurou”, afirmou.João Candido Portinari relatou que soube do caso pela imprensa e descreveu sua reação imediata ao receber a notícia: “Eu fiquei assim chocado, porque a Biblioteca Mário de Andrade é uma joia brasileira também”.Ele destacou que a ausência de comunicação institucional não é novidade para quem se dedica há décadas à preservação da obra de Portinari: “Isso é uma coisa a que eu já estou tão habituado que nem penso mais como desconsideração”.
A importância das gravuras e sua história no acervo brasileiro
As gravuras roubadas pertencem à tiragem limitada da Sociedade dos Cem Bibliófilos, que encomendou a artistas brasileiros séries originais para edições especiais. Portinari ilustrou três obras para a instituição, incluindo Memórias Póstumas de Brás Cubas e O Alienista, de Machado de Assis.Ao explicar o valor artístico das peças, João destacou sua singularidade: “O livro é uma preciosidade, literalmente, tanto do ponto de vista do patrimônio como do ponto de vista do valor comercial”.
Ele lembrou que as gravuras foram exibidas recentemente na Embaixada da Itália, em mostra dedicada ao Portinari ilustrador — faceta menos conhecida do artista.
Apesar do roubo, João ressaltou que outras cópias podem ser vistas pelo público: “A pessoa pode roubar um exemplar, mas são 100 exemplares. Lá nos Museus Castro Maia, a pessoa pode ir lá ver”, explicou.
Indignação e alerta sobre descaso histórico
Para João, o crime expõe uma vulnerabilidade recorrente em instituições culturais brasileiras, tema que acompanha sua trajetória à frente do Projeto Portinari. Ele afirmou que o episódio mistura duas emoções: “É a tristeza pelo ocorrido e a indignação de que você permita que aconteça isso”.O pesquisador relacionou o caso à insuficiência crônica de recursos para preservação de acervos no país: “Muitas vezes não há orçamento. Nós, no Projeto Portinari, muitas vezes nos vimos sem saber como pagar a equipe no mês seguinte”, lembrou.
Impacto cultural e urgência na proteção da memória artística
João Candido Portinari destacou também o papel social da obra de seu pai e a responsabilidade de garantir que ela permaneça acessível ao público. “A missão principal do Projeto Portinari é democratizar o acesso ao legado de Portinari, principalmente junto às crianças e às comunidades atingidas pelo processo de exclusão”, afirmou.Ele concluiu que a perda temporária das gravuras representa mais do que um dano material: é um golpe na memória coletiva. “São coisas que a gente não pode perder de modo algum”, disse ao lembrar a relevância histórica da produção artística do país.
A entrevista encerrou com o compromisso reiterado de João em seguir dedicado à preservação do legado de Portinari e com um apelo para que as instituições brasileiras reforcem a segurança e a responsabilidade sobre o patrimônio cultural nacional. Assista:

