Rubens Barbosa: O Brasil deve enviar Alckmin a Washington
Ex-embaixador defende missão diplomática de alto nível para evitar prejuízos com tarifaço de Trump e preservar os interesses estratégicos do país
247 - Em entrevista ao programa Boa Noite 247, o ex-embaixador do Brasil em Washington e Londres, Rubens Barbosa, defendeu que o governo brasileiro adote uma estratégia diplomática clara e objetiva diante do novo cenário imposto pela presidência de Donald Trump nos Estados Unidos. Para ele, um gesto político concreto é indispensável para que o Brasil tenha sucesso nas negociações comerciais que visam reverter parcialmente o tarifaço de até 50% imposto por Washington a uma ampla lista de produtos brasileiros.Barbosa foi enfático: “Eu acho que o vice-presidente deveria ir a Washington”. Segundo o diplomata, é preciso demonstrar disposição política em abrir um canal direto com o governo americano. “Se o presidente Lula não quiser telefonar, pelo menos tem que ficar claro que houve uma tentativa de diálogo. Sem isso, não vamos ter resultados positivos”, advertiu.
Gesto político como pré-condição
O ex-embaixador ressaltou que o atual ambiente nos Estados Unidos está sob controle direto de Trump, a quem descreveu como uma figura “imprevisível” e centralizadora. Ele destacou que todas as decisões — inclusive comerciais — passam pela aprovação pessoal do presidente. “Tudo é subordinado a ele. A política interna, o Congresso, a Suprema Corte e também a geopolítica”, observou. Com base nisso, argumentou que qualquer avanço na pauta comercial dependerá de um sinal político direto à Casa Branca.Barbosa explicou que, embora o vice-presidente Geraldo Alckmin e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tenham atuado tecnicamente nas negociações, o gesto simbólico de envio de uma autoridade de alto nível à capital americana se tornou uma expectativa explícita de interlocutores influentes, como a Câmara Americana de Comércio. “Eles fizeram uma nota condenando o tarifaço contra o Brasil, mas acrescentaram: o Brasil precisa fazer um gesto e mandar uma autoridade para conversar com a Casa Branca”, relatou.
Interesse estratégico brasileiro em jogo
Para o diplomata, o foco da política externa brasileira, nesse caso, deve ser pragmático: proteger o interesse econômico nacional. “O interesse brasileiro é minimizar o custo dessa tarifa geral para as empresas brasileiras e salvar empregos no Brasil”, afirmou. Segundo ele, essa postura exige separar a crise política e diplomática da agenda comercial.Ao comentar as reações à carta enviada por Trump ao Brasil — na qual há referência ao julgamento dos envolvidos no 8 de janeiro de 2023 — Barbosa minimizou a interpretação de que a exigência americana seria a suspensão desses processos. “Essa é uma opinião deles. Não vejo aquilo como uma condição para negociação”, disse. Para ele, o mais importante é evitar que o ruído político contamine a condução da pauta econômica. “Nós não podemos politizar essa negociação. O Brasil não é a China. Não tem o mesmo peso e não tem como impor condições.”
Uma segunda rodada de negociações
Barbosa demonstrou otimismo quanto à possibilidade de o Brasil ainda conseguir avanços em uma segunda etapa do processo. Segundo ele, cerca de metade dos produtos exportados pelo país continua afetada pela nova tarifa, especialmente itens de interesse brasileiro como café e carne bovina. “Eu sou otimista. Mas para avançar, será preciso fazer um gesto político em direção aos Estados Unidos”, reiterou.O ex-embaixador afirmou ainda que já há movimentação nos bastidores, tanto do governo quanto do setor privado. “Os contatos do Alckmin com o secretário de Comércio e com o USTR (United States Trade Representative) são importantes. Mas temos que organizar uma missão ampla, com setores afetados, para pressionar Washington”, sugeriu.
Diplomacia em tempos de incerteza
Barbosa também fez uma avaliação mais ampla do cenário global. Segundo ele, o mundo vive uma ruptura no sistema multilateral, com o enfraquecimento de instituições como a Organização Mundial do Comércio (OMC) e a ONU. “A ordem internacional baseada em regras desapareceu. Hoje, cada país está defendendo apenas o seu interesse. É a lei da selva”, afirmou.Diante desse novo contexto, ele voltou a enfatizar a importância de o Brasil agir com pragmatismo. “Nós temos que definir o que é o interesse brasileiro e como vamos defendê-lo. Não dá para jogar tudo para o alto por causa da crise política. Isso seria contra os nossos próprios interesses”, concluiu. Assista:



