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Peixe amazônico, produção asiática: como a China assumiu a liderança global do tambaqui

Espécie nativa da Amazônia virou commodity internacional, com produção em escala industrial chinesa

Peixe tambaqui, beiju, batatas e chica (Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil)

247 - Originário da bacia amazônica e historicamente associado à pesca e à piscicultura brasileiras, o tambaqui deixou de ser apenas um símbolo regional para se transformar em uma commodity da aquicultura global. Nas últimas décadas, o peixe cruzou fronteiras, ganhou espaço em sistemas intensivos de criação e passou a ser produzido em larga escala fora do país onde se originou. Hoje, a China ocupa a liderança mundial na produção e exportação do tambaqui, enquanto o Brasil, embora estratégico, aparece em segundo plano quando o critério é volume absoluto, segundo o Click Petróleo e Gás

Planejamento industrial, domínio de escala e integração com cadeias globais de proteína aquática permitiram à China assumir o protagonismo produtivo da espécie, sem que o Brasil perdesse sua relevância técnica e científica.

Um peixe amazônico com características globais

O tambaqui (Colossoma macropomum) é um peixe de água doce conhecido pelo crescimento acelerado, rusticidade e excelente conversão alimentar. Adaptável a variações de oxigênio e a sistemas intensivos de cultivo, atinge pesos comerciais elevados em ciclos relativamente curtos. A carne branca e o bom rendimento industrial reforçam seu apelo econômico.

Essas características despertaram o interesse de países com forte tradição em aquicultura intensiva. Para a China, que busca espécies eficientes para atender um mercado interno gigantesco e manter fluxo constante de exportações, o tambaqui se encaixou de forma quase ideal em seu modelo produtivo.

Estratégia chinesa e produção em escala

A entrada do tambaqui na matriz aquícola chinesa ocorreu por meio de programas controlados de introdução, adaptação genética e aprimoramento dos sistemas de cultivo. Em pouco tempo, a espécie passou a ser criada em tanques escavados, estruturas semi-intensivas e sistemas altamente tecnificados.

O diferencial chinês foi além da biologia. O país estruturou cadeias completas que incluem produção em larga escala, logística integrada, processamento industrial de filés e produtos congelados e capacidade contínua de exportação. Com isso, superou o Brasil em volume total produzido e incorporou o tambaqui ao seu portfólio global de proteínas aquáticas.

Brasil mantém liderança técnica e genética

Mesmo sem liderar o ranking em quantidade produzida, o Brasil continua sendo referência mundial no desenvolvimento do tambaqui. O país abriga os principais bancos genéticos da espécie e domina técnicas fundamentais como reprodução induzida, larvicultura e engorda em clima tropical.

Universidades, centros de pesquisa e empresas brasileiras foram responsáveis por avanços decisivos nessas áreas, muitos deles posteriormente adotados em outros países. Na prática, parte relevante do conhecimento aplicado hoje na Ásia tem origem em pesquisas conduzidas no território brasileiro.

Mercado interno forte, mas pouca padronização

Outro fator que explica a diferença de protagonismo está no destino da produção. No Brasil, o consumo do tambaqui é majoritariamente interno, concentrado sobretudo nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. O peixe é amplamente comercializado fresco, em feiras e mercados regionais, o que limita padronização e volumes exportáveis.

Na China, o tambaqui é tratado como commodity global, integrado a linhas industriais de processamento, congelamento e distribuição internacional. Essa diferença de modelo econômico ajuda a explicar por que a liderança chinesa se consolidou em volume, enquanto o Brasil permaneceu mais focado no mercado doméstico.

Impacto no comércio internacional de pescado

Com a expansão da produção chinesa, o tambaqui passou a disputar espaço no comércio internacional com espécies como tilápia e pangasius. O custo competitivo e o perfil nutricional ampliaram sua atratividade para países importadores de proteína aquática, reforçando a tendência de globalização de espécies antes consideradas locais.

Esse movimento evidencia uma mudança estrutural no setor: a origem biológica já não garante liderança produtiva. Em aquicultura moderna, prevalecem escala, logística, processamento e acesso a mercados globais.

Um retrato da aquicultura no século XXI

A trajetória do tambaqui ilustra como conhecimento científico, quando aliado à capacidade industrial, redefine cadeias produtivas. O peixe nasceu na Amazônia, teve seu cultivo aprimorado no Brasil e alcançou produção massiva na China, tornando-se parte do mercado mundial de pescado cultivado.

Enquanto a China lidera em volume, o Brasil mantém protagonismo genético e tecnológico. São papéis distintos, com impactos diferentes na economia global da aquicultura, mas que mostram como a transformação do conhecimento em escala produtiva se tornou decisiva na disputa por liderança no setor.

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