Revista The Economist faz campanha etarista contra a reeleição de Lula
Editorial da publicação neoliberal tenta deslegitimar o presidente por sua idade e relativiza a força política que derrotou Bolsonaro e enfrentou Trump
247 – A revista britânica The Economist publicou um editorial com forte viés político e tom abertamente etarista contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, defendendo que ele não deveria disputar a reeleição em 2026. O texto deixa claro que a publicação — historicamente alinhada ao receituário neoliberal e ao mundo das finanças — tenta interferir no debate eleitoral brasileiro a partir de critérios que misturam preconceito, seletividade e conveniência ideológica.
Logo de saída, a revista admite que Lula está em posição sólida para vencer a eleição, mas transforma sua idade em argumento central para deslegitimar uma eventual candidatura. O presidente tem 80 anos e, segundo a publicação, seria “arriscado demais” que ele permanecesse mais quatro anos no cargo, sob a alegação de que “candidatos acima de 80 carregam enormes riscos”. Em outro trecho, The Economist chega a afirmar: “Carisma não é escudo contra declínio cognitivo”, numa comparação oportunista com o ex-presidente dos Estados Unidos Joe Biden.
A ofensiva é reveladora: em vez de discutir propostas, resultados de governo ou escolhas do eleitorado, a revista tenta impor uma espécie de veto biológico. É uma retórica que ecoa a lógica tecnocrática de elites que preferem “renovações” controladas, desde que compatíveis com seus interesses — e que, quando a democracia produz lideranças populares com força própria, tratam de desqualificá-las com filtros morais, etários ou supostamente “técnicos”.
A revista reconhece a força de Lula, mas quer impedir sua continuidade
Apesar do ataque, o texto reconhece o protagonismo de Lula em 2025 ao descrever o cenário político brasileiro como “tumultuado”. A publicação cita a prisão de Jair Bolsonaro, condenado por conspirar contra a democracia, e menciona que o presidente Donald Trump tentou explorar o episódio com acusações falsas de perseguição política, além de impor tarifas punitivas ao Brasil. Ainda assim, o editorial admite que Lula enfrentou Trump e o levou a recuar em grande parte.
Ou seja: a própria The Economist registra que Lula manteve a estabilidade institucional, enfrentou pressões externas e ainda preservou capacidade de articulação internacional. Mesmo assim, a revista insiste em que o Brasil “merece escolhas melhores”. A frase tem um subtexto evidente: Lula, por ser Lula — e por representar um projeto político que contraria o receituário neoliberal — não deveria sequer ser uma opção.
“Escândalos” e economia: crítica seletiva para atacar políticas sociais
O editorial também tenta reativar o discurso moralista ao afirmar que Lula estaria “sobrecarregado pelos escândalos de corrupção” de seus primeiros mandatos e que muitos brasileiros “não conseguem perdoá-lo”. Ao mesmo tempo, critica as políticas econômicas do governo como “medíocres”, alegando que se concentram em “benefícios aos pobres”, enquanto as medidas de arrecadação seriam “cada vez menos amigáveis ao empresariado”.
A leitura revela o viés: para a revista, o problema não é o desempenho econômico — ela admite que o Brasil “cresceu surpreendentemente rápido” nos últimos anos — mas o fato de o crescimento conviver com políticas de inclusão social e mecanismos de financiamento do Estado que atingem interesses empresariais. O argumento, no fundo, é o velho incômodo neoliberal com qualquer governo que combine crescimento, proteção social e soberania econômica.
Curiosamente, o texto ainda reconhece que Lula agradou setores empresariais ao apoiar uma reforma para simplificar tributos. Mesmo assim, insiste na caricatura de um presidente “ruim para os negócios”.
A cobrança por “sucessor” soa como tentativa de tutelar o campo progressista
Outro ponto atacado pelo editorial é a suposta ausência de sucessor. A The Economist diz que Lula teria feito “quase nada” para preparar alguém para substituí-lo e menciona que o nome do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teria sido cogitado, mas “descartado por ser cerebral demais”. Também cita que Haddad foi derrotado por Bolsonaro em 2018.
Em seguida, o editorial observa que alguns prefeitos jovens e nomes de centro-esquerda teriam algum apoio, mas não suficiente para deslocar Lula. A crítica, novamente, não se dirige ao processo democrático, mas à ideia de que deveria existir um “candidato alternativo” — preferencialmente menos popular e mais domesticável — para ocupar o espaço do presidente.
A revista chega a afirmar que Lula deveria “fazer um favor ao país” e renunciar à disputa, para permitir “um concurso adequado” por um novo líder do centro-esquerda. A mensagem é direta: Lula atrapalha o plano das elites de controlar a transição política.
A direita: elogios a Tarcísio e apelo por união contra Lula
Se o tratamento a Lula é agressivo, a abordagem em relação à direita é muito mais benevolente. A The Economist menciona que Bolsonaro, condenado a 27 anos de prisão, mantém apoio relevante, especialmente entre evangélicos, e que tentou lançar seu filho Flávio Bolsonaro como candidato. A revista afirma que Flávio é impopular e ineficaz e sugere que a direita deveria abandoná-lo.
Em seguida, surge o elogio ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, descrito como o nome “mais proeminente” e que “já aparece um pouco melhor contra Lula” nas pesquisas. O texto afirma que Tarcísio deveria ter “coragem” de entrar na disputa e o descreve como “pensativo e democrata”, destacando que ele tem apenas 50 anos — numa clara comparação destinada a reforçar o argumento etário contra Lula.
A revista então desenha o candidato ideal para derrotar o presidente: alguém de centro-direita que “corte burocracia, mas não florestas”, seja “duro contra o crime, mas respeite liberdades civis”, e que defenda o Estado de Direito. A retórica, porém, ignora que a última grande onda de “combate à corrupção” e “choque liberal” no Brasil abriu caminho para a destruição institucional e para o bolsonarismo.
Editorial tenta reescrever o debate democrático com filtros elitistas
O editorial termina com um apelo: já que Lula provavelmente não desistirá, então a direita deveria se organizar e apresentar um candidato viável para superar a polarização “Lula-Bolsonaro”. Mas a própria análise da revista deixa evidente que Lula segue central porque foi ele — e não os “novos rostos” preferidos pelos editoriais internacionais — quem derrotou Bolsonaro e preservou a democracia em meio à crise institucional.
Ao colocar a idade como eixo da crítica, a The Economist tenta deslocar o debate de ideias e projetos para uma espécie de veto indireto, baseado em supostos riscos biológicos. Trata-se de uma forma sofisticada de campanha política: a revista não diz que Lula deve ser combatido por suas políticas populares, mas insinua que ele não deveria ser candidato porque é “velho demais”.
A tentativa de enquadramento é reveladora: quando o voto popular se inclina a uma liderança progressista, as elites internacionais frequentemente recorrem ao repertório de tutelas — “responsabilidade fiscal”, “confiança do mercado”, “governabilidade” — e agora, também, ao argumento etário. No caso brasileiro, o editorial deixa a impressão de que a revista não está preocupada com a democracia, mas com o resultado que ela pode produzir.
Ao fim, o texto funciona menos como análise e mais como intervenção política: uma campanha editorial da revista neoliberal contra Lula, embalada por etarismo e por uma defesa indireta de alternativas alinhadas aos interesses do mercado.



