China critica escalada tarifária em meio a superávit recorde de US$ 1 trilhão
Em reunião com chefes das principais organizações econômicas, incluindo Dilma Rousseff, do Banco dos BRICS, premiê alerta para riscos do protecionismo
247 - O premiê chinês Li Qiang fez um apelo direto contra o avanço do protecionismo mundial durante o “Diálogo 1+10” com líderes de grandes instituições econômicas, realizado nesta terça-feira (9) em Pequim. A manifestação ocorre um dia após a China registrar um superávit comercial histórico de US$ 1 trilhão.
No encontro, segundo a Reuters, Li apontou que a proliferação de tarifas tem ampliado tensões globais e comprometido a atividade econômica internacional. Diante de autoridades do FMI, Banco Mundial, OMC, OCDE e OIT, ele defendeu que a governança global precisa ser fortalecida diante da escalada de barreiras comerciais.
Pressão por reformas e tensões além dos EUA
A expansão do superávit chinês reacendeu críticas de parceiros que cobram reformas estruturais para reduzir a dependência do país das exportações e ampliar o peso do consumo interno. Além dos Estados Unidos, governados pelo presidente Donald Trump, a China enfrenta crescentes atritos comerciais com Europa, Austrália e economias do Sudeste Asiático.
“Desde o início do ano, a ameaça de tarifas paira sobre a economia global, com várias restrições comerciais proliferando e afetando gravemente a atividade econômica mundial”, afirmou Li no encontro. Segundo ele, “as consequências mutuamente destrutivas das tarifas estão se tornando cada vez mais evidentes”.
Analistas veem superávit como motor da onda tarifária
Especialistas apontam que o enorme superávit chinês e a lentidão do país em ajustar seu modelo econômico sustentado por exportações alimentam a adoção de tarifas em diversas regiões. Ainda assim, não enxergam incentivos para que Pequim altere sua estratégia no curto prazo.
A economista Alicia Garcia-Herrero, do think tank Bruegel, foi categórica ao afirmar: “A China não está tomando nenhuma medida, e acho que não tem intenção de fazê-lo". Segundo ela, “não vejo a China se importando com nenhum desses visitantes".
Garcia-Herrero acrescentou que a contribuição da China para o crescimento global em 2025, estimada em cerca de 40%, reforça o papel central das exportações no país. “Não lembro de um nível tão alto, e como a China supostamente está crescendo, não há razão para uma dependência tão grande da demanda externa".
Redirecionamento de exportações após tarifas dos EUA
Dados divulgados na segunda-feira mostram forte aumento das vendas chinesas para Europa, Austrália e países do Sudeste Asiático — reflexo do redirecionamento de produtos diante das tarifas impostas pelo governo Trump.
O economista-chefe para Ásia-Pacífico do HSBC, Fred Neumann, destacou que “as tarifas de importação dos EUA desviaram as exportações chinesas para outros destinos, agravando a pressão competitiva em diversas partes do mundo". Ele avaliou ainda que, embora distorçam fluxos comerciais, tarifas não resolvem desequilíbrios econômicos de origem estrutural.
Impasse estrutural e risco de novas barreiras
Pequim afirma estar comprometida em reduzir a dependência da indústria pesada e das exportações, prometendo medidas para estimular o mercado interno. Entretanto, analistas observam que encontros importantes da liderança do Partido Comunista indicam resistência em abandonar a lógica baseada na produção.
Brad Setser, ex-funcionário do governo norte-americano e pesquisador do Council on Foreign Relations, avaliou na rede X que ainda não há sinais de que as tarifas impostas por Trump tenham contido a expansão das exportações chinesas.
Neumann, do HSBC, pondera que o reforço da demanda interna chinesa ajudaria a aliviar as tensões globais, mas considera improvável uma guinada dessa magnitude sem forte flexibilização das políticas econômicas. Caso isso não ocorra, países afetados pela disputa comercial podem reforçar suas próprias barreiras.
Garcia-Herrero resume o clima entre as principais economias: “Acho que os países estão começando a pensar: que instrumentos temos para conter isso?” Em referência ao intenso fluxo de autoridades europeias a Pequim — entre elas Emmanuel Macron, o rei Felipe da Espanha e ministros da Alemanha — ela afirmou: “É evidente que é por isso que todos estão batendo à porta da China.” Para a economista, “a pressão está aumentando, e a China não está pronta para responder".



