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"Ele é polícia, é promotor e é juiz", disse presidente TCE-PR em grampo ilegal de Moro

Áudio apreendido pela PF revela críticas diretas ao então juiz em gravação sem autorização contra autoridade com foro privilegiado

Sergio Moro e Heinz Herwig (Foto: Waldemir Barreto/Agência Senado | Sandro Nascimento/Alep)

247 - Uma gravação realizada sem a devida autorização de tribunais superiores contra o então presidente do Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR), Heinz Herwig, revela críticas diretas à atuação de Sergio Moro quando ele era juiz federal em Curitiba. O áudio, feito em fevereiro de 2005, integra um conjunto de documentos e mídias apreendidos pela Polícia Federal na 13ª Vara Federal e aponta o uso de escutas ilegais contra autoridades com foro privilegiado, informa Daniela Lima, do UOL.

A síntese dos relatórios de inteligência apreendidos pela Polícia Federal reforça suspeitas de que colaboradores e delatores foram utilizados para monitorar autoridades fora do alcance legal do juízo de primeira instância, sem autorização do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Na gravação, com cerca de 40 minutos de duração e transcrita em aproximadamente 20 páginas, Heinz Herwig faz uma das declarações mais contundentes sobre o então magistrado. “Na verdade, ele é polícia, é promotor e é juiz”, afirma o presidente do TCE-PR durante a conversa com o delator Tony Garcia. Em outro trecho, Garcia também critica a conduta de Moro: “Tudo o que você fala ele diz que é mentira. Quem cair na mão desse cara está ferrado”.

À época, Heinz Herwig ocupava um cargo que lhe garantia foro privilegiado, o que exigia autorização expressa do STJ para qualquer investigação. Ainda assim, a gravação foi realizada e, cinco meses depois, segundo documentos apreendidos, Moro determinou formalmente que o delator repetisse a tentativa de escuta, mesmo sem a devida autorização judicial.

Gravação integra acordo de delação

A investigação sobre Heinz Herwig consta expressamente no acordo de delação premiada firmado por Tony Garcia e assinado por Sergio Moro. O termo previa a apuração de eventual envolvimento do então presidente do TCE-PR com uma grande empresa do setor alimentício, atualmente em processo de falência. “O beneficiário se compromete a testemunhar e trazer prova documental”, registra o acordo.

No diálogo gravado, esse tema aparece de forma secundária e é tratado com desdém por Heinz. A conversa se concentra na pressão exercida pela Justiça e nos métodos adotados na investigação. Tony Garcia relata a prisão e a busca realizada em sua casa. “Eles estão querendo aparecer”, diz Heinz. “Querem fazer negócio”, responde o delator. “Agora, quem corre risco? Corro risco eu, corre risco você.” Heinz concorda: “Eu, claro”.

Ao longo da gravação, surgem ainda referências a outras autoridades com foro privilegiado, conteúdo que, pela legislação, deveria ter sido submetido à análise de tribunais superiores, o que não ocorreu.

Relatórios ocultos e despacho de Moro

A Polícia Federal encontrou registros sumários da gravação envolvendo Heinz Herwig em relatórios que haviam sido encaminhados ao Supremo Tribunal Federal, mas a íntegra do áudio permaneceu guardada nas gavetas da 13ª Vara Federal de Curitiba. Segundo a investigação, parte relevante desse material nunca foi juntada aos autos.

Em despacho datado de julho de 2005, ao analisar relatórios da Polícia Federal, Moro escreveu: “Considerando os termos do acordo, reputa este Juízo conveniente tentativas de reuniões, com escuta ambiental, com Roberto Bertholdo, Michel Saliba e novamente com Heinz, visto que as gravações até o momento são insatisfatórias para os fins pretendidos”.

A ordem de busca e apreensão na 13ª Vara Federal foi expedida pelo ministro Dias Toffoli, após sucessivas solicitações do Supremo Tribunal Federal por documentos, fitas e gravações que não haviam sido enviados à Corte, mesmo depois da saída de Moro da magistratura. Toffoli apura denúncias de que delatores teriam sido usados para monitorar autoridades fora do alcance legal do então juiz, com o objetivo de pressioná-las posteriormente. O procedimento tramita sob sigilo.

Defesa de Moro

Procurado, Sergio Moro afirmou, por meio de sua assessoria, que a investigação em curso no STF se baseia em “relatos fantasiosos do criminoso condenado Tony Garcia”. 

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