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Brasil tem potencial para liderar cadeia global de terras raras

Pesquisador aponta que reservas e conhecimento científico colocam país em posição estratégica, mas avanço depende de política pública e investimentos

Com apoio do BNDES, o Brasil avança na exploração sustentável de minerais estratégicos — como lítio, cobre e terras raras — e se posiciona como protagonista global na transição energética e na nova indústria de baixo carbono (Foto: Divulgação/Freepik )

247 - O Brasil reúne condições únicas para ocupar uma posição central no mercado mundial de terras raras, insumos essenciais para a transição energética e para a indústria de alta tecnologia. A avaliação é do professor Sérgio Michielon, coordenador do recém-criado INCT Matéria, que reúne 15 instituições nacionais dedicadas ao desenvolvimento de materiais avançados.

Segundo a Agência Gov,  o país possui a segunda maior reserva global desses 17 elementos químicos estratégicos, atrás apenas da China. Michielon afirma que transformar essa vantagem geológica em soberania tecnológica depende de uma política pública estruturada, ampliação de investimentos e mecanismos que permitam o acesso das instituições de pesquisa às amostras minerais.

“Os materiais de terras raras representam apenas 1% do valor total de um celular. Pode parecer pouco, mas sem esse 1% não existiria o aparelho. Isso significa que as terras raras não estão no centro do debate por seu potencial financeiro, mas sim pelo seu valor estratégico”, explica o pesquisador, que também é professor da Universidade Federal do Amazonas (UFAM).

Desafios para transformar potencial em riqueza

O INCT Matéria, coordenado por Michielon, atua em toda a cadeia produtiva — da extração ao desenvolvimento de tecnologias aplicadas, passando pela reciclagem de materiais. O pesquisador destaca que o Brasil reúne matéria-prima, produção acadêmica relevante e especialistas capacitados, mas enfrenta entraves que impedem o avanço do setor.

“O Brasil tem a matéria-prima e o conhecimento, mas ainda faltam investimentos e a criação de uma política pública específica. Precisamos criar o ecossistema para transformar nosso potencial em riqueza e inovação”, afirma.

Um dos obstáculos é o acesso limitado de universidades e centros de pesquisa às amostras produzidas pela mineração. Segundo ele, rejeitos industriais frequentemente contêm altas concentrações de terras raras, mas pesquisadores têm dificuldade para obtê-los. “Isso é algo que teria de ser resolvido no âmbito da legislação”, observa.

Formação de especialistas e retenção de talentos

O pesquisador também chama atenção para a necessidade de formar mão de obra qualificada e, sobretudo, manter esses profissionais no país. O INCT Matéria integra duas instituições de ensino técnico com o objetivo de inspirar novos talentos e criar continuidade científica.

“É algo importante por ajudar a inspirar as novas gerações a se interessarem por esse tema, que é o que garante sustentabilidade ao longo das décadas”, diz. Ele alerta, porém, que apenas formar especialistas não resolve o problema. “Hoje, o país investe alto na formação do profissional, mas ele vai para o exterior por não encontrar mercado no Brasil. Ou seja, a empresa estrangeira recebe de graça um profissional altamente qualificado custeado por nós. Precisamos criar condições que permitam a essas pessoas construir sua carreira aqui.”

Parcerias que impulsionam a cadeia produtiva

Entre as iniciativas em andamento, Michielon destaca o Centro de Inovação e Tecnologia para Ímãs de Terras Raras (CIT Senai ITR), criado em Lagoa Santa (MG). Trata-se de um laboratório-fábrica dedicado ao desenvolvimento de ímãs permanentes de alto desempenho — insumos estratégicos para carros elétricos, turbinas eólicas e diversos equipamentos eletrônicos.

O projeto é resultado de uma parceria entre Senai, Fiemg e o consórcio MagBras, formado por 28 empresas, sete institutos de pesquisa e três fundações. “A iniciativa mostra a sinergia necessária entre academia e indústria para fomentar o desenvolvimento da cadeia produtiva nacional para a fabricação de imãs permanentes de terras raras”, resume Michielon.

Três frentes para estruturar a liderança brasileira

Com duração prevista de cinco anos, o INCT Matéria organiza sua atuação em três eixos principais:

  1. Produção nacional de ímãs de neodímio-ferro-boro, considerados os mais avançados do mercado e indispensáveis para a miniaturização de dispositivos;
  2. Estudos sobre novas propriedades e aplicações dos elementos de terras raras;
  3. Desenvolvimento de rotas metalúrgicas sustentáveis para beneficiamento e concentração dos minérios.

Um dos focos é a chamada “mineração urbana”, que busca reciclar ímãs descartados, especialmente de produtos como carros elétricos, para evitar o desperdício de recursos estratégicos. “O objetivo é garantir que os recursos minerais de produtos como carros elétricos não sejam desperdiçados no futuro”, afirma o pesquisador.

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