Appio pede à PF inquérito contra Moro por coação
Juiz afastado afirma que declarações públicas tentam interferir em apurações no STF
247 - O juiz federal afastado Eduardo Appio solicitou à Polícia Federal a abertura de inquérito para apurar possível crime de coação no curso do processo, atribuindo a iniciativa a declarações públicas feitas pelo senador Sergio Moro (União Brasil-PR). Segundo Appio, as manifestações teriam potencial para interferir em investigações sigilosas que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) e nas quais ele atua como testemunha.
No documento encaminhado ao diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, Appio afirma ser “testemunha-chave em três inquéritos sigilosos” sob a relatoria do ministro Dias Toffoli. De acordo com o magistrado, as declarações do senador possuem “natureza difamante” e configurariam tentativa de constrangimento e pressão indevida sobre procedimentos em andamento no STF.
Appio assumiu processos da Lava Jato após Sergio Moro deixar a magistratura, em 2018, para integrar o Ministério da Justiça no governo Jair Bolsonaro. Segundo ele, as investigações envolvendo a atuação do ex-juiz e de outros integrantes da força-tarefa tiveram início apenas após sua posse na 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, em fevereiro de 2023. No documento enviado à Polícia Federal, Appio afirma que “desvios bilionários de fundos públicos da União e acordos de leniência fraudulentos” tiveram sigilos retirados e os fatos foram comunicados à Procuradoria-Geral da República, ao STF e ao Conselho Nacional de Justiça em maio de 2023.
Em manifestação pública, Appio declarou que seguirá colaborando com as apurações. “Continuarei sendo testemunha no Supremo Tribunal Federal custe o que custar, independente das pressões de Moro e sua turma”, afirmou. Na carta, ele também menciona a atuação de Moro nas redes sociais e sua influência política, alegando que essas manifestações teriam como objetivo “o arquivamento ou absolvição do Senador Sergio Moro e seus cúmplices (inclusive Deltan Dallagnol)”.
O senador reagiu afirmando que a representação apresentada por Appio “carece de qualquer lógica e base legal”. Moro relacionou o pedido ao Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que afastou Appio por tempo indeterminado das funções. O procedimento disciplinar teve como base um boletim de ocorrência da Polícia Civil de Santa Catarina, que atribui ao juiz o suposto furto de garrafas de champanhe em um supermercado de Blumenau (SC). Appio nega as acusações.
As declarações de Moro foram reforçadas publicamente pelo ex-procurador da República Deltan Dallagnol, que comentou o caso em publicação na rede social X. Na manifestação, ele mencionou o uso do código “LUL22” por Appio como login em sistemas da Justiça Federal, sigla adotada pelo magistrado como protesto contra a prisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2018.
Na carta à Polícia Federal, Appio relata o que classifica como “agressão digital orquestrada” desde que passou a colaborar com as apurações. “Após 31 anos de serviço público honesto e imaculado, agora sofro, na condição de testemunha-chave, agressão digital orquestrada com a finalidade de me coagir e interferir nos trâmites dos inquéritos sigilosos”, escreveu. Ele também menciona uma operação recente autorizada pelo STF, com busca e apreensão na 13ª Vara Federal de Curitiba, antiga sede da Lava Jato.
As investigações citadas estão sob a responsabilidade do ministro Dias Toffoli, que autorizou, no domingo (3), o acesso da Polícia Federal a processos da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba. A medida está relacionada a apurações baseadas em declarações do empresário e ex-deputado Tony Garcia, que afirma ter sido coagido a produzir gravações ilegais contra autoridades desde o caso Banestado, no fim de 2004, até o encerramento da Lava Jato, em 2021.
Appio também menciona, no documento encaminhado à PF, decisões recentes do STF envolvendo Sergio Moro. Em outubro, a Primeira Turma da Corte formou maioria para manter o senador como réu em ação penal por declarações contra o ministro Gilmar Mendes. O processo teve origem em um vídeo divulgado em abril de 2023, no qual Moro afirma: “Não, isso é fiança, instituto... pra comprar um habeas corpus do Gilmar Mendes”. Posteriormente, o senador se desculpou, e sua defesa alegou tratar-se de uma “brincadeira infeliz”.



