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Mais da metade dos professores da educação básica terá isenção do IR

Estudo do Ipea indica que 73,5% dos docentes terão redução ou isenção total do IR com a nova lei sancionada por Lula

Professor em sala de aula (Foto: CECILIA BASTOS/USP Imagens)

247 - A reforma do Imposto de Renda sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve provocar um impacto direto e significativo na renda de professores da educação básica em todo o país. Com a ampliação da faixa de isenção para salários mensais de até R$ 5 mil, mais de 600 mil docentes deixarão de pagar o tributo, fazendo com que pouco mais da metade da categoria passe a ser totalmente isenta.

As conclusões constam de uma nota técnica elaborada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgada pela Agência Gov, que analisou os efeitos da Lei nº 15.270/2025 sobre os rendimentos do magistério da educação básica no Brasil. O estudo aponta que, ao todo, 73,5% dos professores serão beneficiados, seja por meio da isenção integral, seja pela redução da carga tributária.

Ampliação da isenção e impacto fiscal

A nova legislação não apenas eleva o teto de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física para R$ 5 mil mensais, como também estabelece descontos graduais para rendas de até R$ 7.350. Segundo o Ipea, a medida representa uma renúncia fiscal estimada em R$ 25,4 bilhões, que deverá ser compensada pela arrecadação adicional de R$ 34,1 bilhões prevista com a tributação sobre altas rendas em 2026.

Antes da mudança, apenas 19,7% dos docentes da educação básica estavam isentos do imposto. Com a reforma, esse percentual sobe para 51,6%. Outros 21,9% passam a integrar a faixa de redução do tributo, elevando para cerca de 1 milhão o número de professores que terão aumento na renda disponível. Desse total, aproximadamente 620 mil deixarão de pagar qualquer valor de IR.

Ganho relevante para quem está próximo ao piso

O impacto é especialmente expressivo entre professores que recebem salários próximos ao piso nacional do magistério, fixado em R$ 4.867,77 em 2025. De acordo com Paulo Nascimento, coordenador de Educação do Ipea e um dos autores do estudo, a mudança altera de forma substancial a tributação sobre esses rendimentos.

“Antes da reforma, eles pagavam a alíquota máxima de 27,5% sobre a base tributável. Com a nova isenção até R$ 5 mil, passam a não pagar nada de IRPF sobre esse salário”, afirma. Segundo ele, o ganho médio anual estimado para esse grupo é de R$ 5.079,84. “É como um 13º salário extra derivado apenas da reforma tributária.”

Diferenças entre vínculos de trabalho

A análise também revela diferenças importantes conforme o tipo de vínculo profissional. Entre docentes com apenas um vínculo empregatício, concentrados nas faixas mais baixas de renda, 60,7% passam a ser isentos e 21,1% terão redução do imposto, totalizando 81,8% de beneficiados.

Já entre professores com múltiplos vínculos — cerca de 17,5% da categoria —, 32,3% ficarão isentos e 26,1% terão redução do IR. No grupo que acumula a docência com outra ocupação fora da educação, 40,2% passam à isenção, enquanto 38,9% permanecem submetidos à alíquota máxima.

Apesar dos resultados positivos, o pesquisador Adriano Senkevics, também autor da nota técnica, faz uma ponderação. “Por mais que esses resultados demonstrem efeitos positivos da reforma tributária sobre o rendimento da categoria docente, eles também alertam para a necessidade de maior valorização da carreira de professoras e professores”, afirma. Ele destaca que a situação é ainda mais crítica na rede privada, onde os salários frequentemente ficam abaixo do piso do magistério público.

Percepção dos professores beneficiados

Na prática, a mudança já é vista com expectativa por profissionais da educação. Luana Graziela da Cunha Campos, 28 anos, professora do ensino fundamental em Cianorte (PR), afirma que a isenção fará diferença no orçamento familiar. “Vejo isso como uma vantagem, pois é um valor descontado todos os meses do nosso salário e que, ao final do ano, faz diferença”, diz. Segundo ela, a economia poderá ser direcionada à formação dos filhos.

Fernando Lourenço, 26 anos, professor temporário em Ceilândia (DF), não terá isenção total, mas será beneficiado com a redução do imposto por estar na faixa de até R$ 7.350. “Essa diferença não faz milagre, mas com certeza irá ajudar em algumas coisas, como completar a gasolina ou ter um momento de lazer a mais no fim de semana”, afirma.

Ele também chama atenção para a necessidade de políticas complementares. “Apesar de o piso ser nacional, quem define os salários pagos aos docentes da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio são estados e municípios. Então, além do governo federal, também é importante que os governadores e os prefeitos estejam dedicados a ações de valorização da classe”, observa Senkevics no estudo.

Rede pública e rede privada

O impacto da nova tabela do IRPF varia significativamente entre as redes de ensino. Na rede privada, 82,2% dos professores passarão a ser isentos após a reforma, percentual bem superior ao observado na rede pública, onde a taxa chega a 42,5%. A diferença está relacionada à estrutura salarial: enquanto o setor público apresenta remuneração média mais elevada e homogênea, a rede privada concentra jornadas parciais e salários mais baixos.

“Em síntese, a ampliação da isenção beneficia a maioria dos docentes de ambos os segmentos, mas o efeito proporcionalmente mais intenso recai sobre quem leciona em escolas privadas, justamente porque ali há mais gente ganhando até o novo teto de isenção”, explica Paulo Nascimento.

O estudo também aponta variações relevantes entre as unidades da federação. Alagoas, Minas Gerais, Paraíba, Tocantins e Roraima lideram a lista de estados com maior proporção de docentes isentos, todos com percentuais iguais ou superiores a 60%. No outro extremo, Amapá, Distrito Federal, Pará e Goiás concentram percentuais elevados de professores ainda submetidos à alíquota máxima.

O caso do Distrito Federal se destaca: mesmo após a reforma, 63,4% dos docentes permanecem na faixa de tributação mais alta, reflexo de salários relativamente superiores no magistério local.

Metodologia do estudo

Para chegar aos resultados, os pesquisadores utilizaram dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), principal base administrativa nacional sobre vínculos formais de trabalho. A identificação dos docentes foi feita a partir de códigos de ocupação (CBO) e atividade econômica (CNAE), com exclusão de casos atípicos, como salários extremamente elevados ou jornadas muito reduzidas.

Segundo Nascimento, a Rais permite uma visão consistente da renda do trabalho docente em escala nacional, embora apresente limitações. “Na prática, o ideal seria uma integração Rais–Censo Escolar, combinando a riqueza de informações salariais e de vínculos da Rais com o detalhamento escolar e pedagógico do Censo”, afirma.

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