STF não deve comprar briga com o Congresso contra o PL da Dosimetria
Além de ter participado da elaboração do projeto, a Corte entende ser prerrogativa do Congresso a definição de penas
247 - Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) avaliam que a Corte não deve impor obstáculos ao Projeto de Lei da Dosimetria, aprovado pelo Senado, que altera critérios de aplicação de penas e pode reduzir o tempo de prisão de Jair Bolsonaro (PL) e de outros condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, informa o jornal O Globo. A leitura predominante é a de que cabe ao Congresso Nacional definir parâmetros penais, o que tornaria pouco provável o sucesso de eventuais questionamentos ao Judiciário, embora o tema ainda gere divergências internas no tribunal.
Além disso, o projeto foi fruto de uma ampla articulação institucional. Quando a proposta ainda tramitava na Câmara dos Deputados, ministros já sinalizavam, de forma reservada, que o texto não representava um atropelo às prerrogativas da Corte, mas sim o resultado de uma negociação entre os Poderes.
A legislação atual prevê que o juiz da execução penal deve analisar individualmente a situação de cada condenado, inclusive para progressão de regime. No caso de Jair Bolsonaro, essa atribuição cabe ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, que também é relator das investigações e ações penais relacionadas à tentativa de golpe.
Nos bastidores do Senado, a costura em torno da redação final do PL da Dosimetria contou diretamente com a participação de Moraes, de acordo com Malu Gaspar, do jornal O Globo. A informação foi revelada pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE) durante sessão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Segundo ele, o ministro atuou para ajustar o texto aprovado pela Câmara e alinhar a proposta ao entendimento previamente negociado com o Supremo.
De acordo com relatos, Moraes procurou ao menos quatro senadores para discutir mudanças no texto, entre eles o presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e o ex-presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG). O ministro teria argumentado que a versão aprovada pela Câmara não correspondia ao acordo previamente alinhado com o STF pelo relator da proposta, o deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP).
Uma das principais alterações acertadas foi a delimitação do alcance da redução de penas exclusivamente aos crimes relacionados aos atos golpistas de 8 de janeiro. Com isso, foi retirada a possibilidade de aceleração da progressão de regime para condenações por crimes como exploração sexual, coação no curso do processo e organização criminosa.
A mudança foi formalizada por meio de uma emenda apresentada pelo senador Sergio Moro (União-PR), acolhida pelo relator no Senado, Espiridião Amin (PP-SC). A alteração foi classificada como emenda de redação, e não de mérito, o que permitiu o envio direto do texto ao Palácio do Planalto para sanção presidencial, sem a necessidade de nova votação na Câmara dos Deputados.
Apesar de participar das articulações, Alexandre de Moraes fez críticas públicas à redução de penas durante julgamento realizado na terça-feira (16), no STF, envolvendo o núcleo 2 da trama golpista. Na ocasião, o ministro alertou para o risco de que atenuantes em condenações já definidas após o devido processo legal transmitam uma mensagem equivocada à sociedade. "Não é possível mais discursos de atenuante em penas, em penas aplicadas depois do devido processo legal, aplicadas depois da ampla possibilidade de defesa, porque isso seria um recado à sociedade de que o Brasil tolera ou tolerará novos flertes contra a democracia", declarou Moraes. "A resposta estatal deve ser dura para punir aqueles que tentaram acabar com a democracia do Brasil".
O PL da Dosimetria foi concebido como uma alternativa à proposta de anistia ampla defendida por setores bolsonaristas. Durante as negociações, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) chegou a afirmar que o perdão ao pai seria seu “preço” para retirar a pré-candidatura à Presidência da República, movimento que gerou resistência no Centrão. Ao final, o projeto foi aprovado com o aval de Jair Bolsonaro, consolidando um acordo político que envolveu oposição, interlocutores do Judiciário e até alguns governistas.



