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Estado de S. Paulo detona Gilmar e vê sua decisão como 'teratológica'

Editorial critica liminar que restringe pedidos de impeachment e afirma que medida distorce lei vigente desde 1950

Gilmar Mendes (Foto: Evandro Macedo/LIDE)

247 – O ministro Gilmar Mendes, decano do Supremo Tribunal Federal (STF), acolheu liminarmente pedido do Solidariedade e da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) para determinar que apenas a Procuradoria-Geral da República (PGR) possa apresentar pedidos de impeachment contra ministros do STF e contra o procurador-geral da República.

A crítica foi publicada em editorial do jornal Estado de S. Paulo, que classificou a decisão como “teratológica” — termo jurídico usado para designar algo monstruoso, grotesco, radicalmente contrário à lógica ou ao ordenamento jurídico.

Segundo o jornal, ao cassar a legitimidade de qualquer cidadão para denunciar ministros do Supremo ou o chefe do Ministério Público Federal junto ao Senado, Gilmar Mendes “contorceu” a Lei 1.079/50, a Lei de Impeachment, e anulou sozinho uma sistemática jurídica que atravessou três Constituições ao longo de 75 anos sem jamais ter sido questionada.

Uma lei histórica ignorada pela liminar

O editorial lembra que a Lei de Impeachment é explícita em seu artigo 41: qualquer cidadão pode denunciar ministros do STF e o procurador-geral da República por crimes de responsabilidade. Essa regra, criada em 1950, permaneceu íntegra e respeitada nas Constituições de 1946, 1967 e 1988.

Para o jornal, restringir essa prerrogativa representa romper com a lógica republicana que sempre garantiu ao Senado o papel de controlar autoridades de alta relevância institucional, a partir do escrutínio de denúncias feitas por qualquer brasileiro.

Crítica à argumentação do Solidariedade e da AMB

O Estado de S. Paulo classifica como “fraca” e “conveniente” a tese apresentada pelos autores das ADPFs 1.259 e 1.260, segundo a qual a Constituição de 1988 não teria recepcionado os dispositivos da lei de 1950 relativos ao impeachment de ministros do STF.

O jornal destaca ainda a coincidência temporal: essas ações foram apresentadas justamente no momento em que o Supremo enfrenta críticas por condutas de alguns de seus integrantes consideradas potencialmente indecorosas ou até ilegais. Para o editorial, essa “urgência” não passa de reação corporativista.

Crise de confiança e desgaste do STF

O texto aponta duas raízes para a crise de confiança que atinge a imagem da Corte.

De um lado, há a campanha de deslegitimação promovida por inimigos do Estado Democrático de Direito — alguns já condenados por tentativa de golpe.

De outro, o próprio Supremo contribuiu para o desgaste ao tolerar comportamentos incompatíveis com a magistratura, como usurpação de competências de outros Poderes, violações da Lei Orgânica da Magistratura, participação em eventos com empresários envolvidos em conflitos de interesses e manutenção de atividades privadas inadequadas à função de ministro.

Editorial rejeita argumento do “crime de hermenêutica”

O jornal rebate a alegação dos autores das ADPFs de que haveria risco de punição por “crime de hermenêutica”, isto é, impeachment por divergência de interpretação jurídica.

Segundo o texto, a Lei 1.079/50 não sugere que ministros possam ser removidos por decisões judiciais, mas por atos que violem a lei, o decoro, a ética republicana e a dignidade do cargo.

Senado sempre rejeitou pedidos, lembra jornal

O editorial destaca que, desde 1988, centenas de pedidos de impeachment foram apresentados por cidadãos contra ministros do STF — e nenhum jamais foi aceito.

Para o Estado de S. Paulo, isso demonstra maturidade institucional do Senado, que tem barrado abusos. Mas também abre espaço para suspeitas: a liminar de Gilmar Mendes poderia servir para blindar ministros na próxima legislatura, quando a oposição ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva espera ter maioria no Senado.

Impacto institucional

O texto conclui que o impeachment de um ministro do STF, embora traumático e indesejável, existe como instrumento excepcional e legítimo.

O jornal sustenta que seu uso responsável não ameaça a República; ao contrário, reforça o princípio de que não existem poderes absolutos no Brasil.

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