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Lewandowski passa a defender criação do ministério da Segurança Pública

Ministro da Justiça condiciona divisão da pasta à aprovação de PEC, ampliação do papel da União e destinação de recursos substanciais

Ricardo Lewandowski (Foto: Isaac Amorim/MJSP)

247 – O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, mudou de posição e passou a defender a criação do Ministério da Segurança Pública, tema que anteriormente rejeitava. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, o ministro afirmou que a divisão da atual pasta só fará sentido se houver a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata do tema, além da definição clara do papel da União no combate à criminalidade e da destinação de recursos expressivos para a nova estrutura.

Lewandowski alinhou-se à posição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que já declarou que só enviará a proposta ao Congresso caso a PEC seja aprovada. “Se não houver clareza e não houver um aporte substancial de recursos novos, porque o combate à criminalidade precisa de recursos, nós simplesmente teremos mais do mesmo”, afirmou o ministro.

Mudança de posição e exigência de recursos

Questionado sobre a mudança de entendimento, Lewandowski explicou que hoje concorda com a divisão da pasta desde que haja fortalecimento do papel da União. “Eu concordo com o presidente que essa divisão faria sentido, primeiro, se houvesse uma ampliação do papel da União no combate à criminalidade. Em segundo lugar, se viessem verbas substanciais”, disse. Ele citou como exemplo o orçamento do Fundo Nacional de Segurança Pública, que classificou como insuficiente: “Hoje nós temos no nosso Fundo Nacional de Segurança Pública a verba irrisória de R$ 2 bilhões”.

Ao comparar com os estados, destacou: “Só para ter uma ideia, o Estado da Bahia tem R$ 8 bilhões para segurança”.

Críticas à PEC da segurança na Câmara

Lewandowski criticou as alterações feitas pelo relator da PEC da segurança na Câmara, deputado Mendonça Filho (União-PE). Segundo ele, o texto aprovado pelos deputados vai na direção oposta à proposta original do Executivo. “Nós apresentamos a centralização do combate ao crime. O principal ponto da PEC era justamente uma coordenação de forças e isso ficou de fora”, afirmou.

Para o ministro, a descentralização defendida no relatório representa um retrocesso em relação ao Sistema Único de Segurança Pública (Susp). “Em vez de haver uma coordenação centralizada ao nível da União, como é a proposta do Susp, haveria inclusive um retrocesso”, disse.

Defesa do modelo da Operação Carbono Oculto

Um dos pontos centrais da entrevista foi a defesa do modelo adotado na Operação Carbono Oculto, que revelou a infiltração do crime organizado no setor de combustíveis. Lewandowski classificou a ação como exemplar. “A Carbono Oculto é uma operação paradigmática; não foi disparado um tiro. Ninguém morreu, ninguém ficou ferido”, afirmou.

Segundo ele, a operação traduz o espírito da PEC da segurança ao promover a atuação integrada de forças federais e estaduais, além de órgãos como o Ministério Público, Receita Federal e Coaf. “A ideia é não usar só a força física, mas sim a inteligência”, disse.

Ao comparar com a megaoperação realizada no Rio de Janeiro, que deixou 122 mortos, Lewandowski ressaltou a diferença de abordagem. “Uma operação com 122 mortos é uma operação, no mínimo, cruenta”, afirmou, defendendo que o combate ao crime deve ocorrer dentro dos limites da Constituição e do Estado Democrático de Direito.

PL antifacção e soberania nacional

O ministro também comentou o projeto de lei antifacção enviado pelo governo ao Congresso. Ele explicou que o texto busca enfrentar um fenômeno novo com instrumentos modernos e integrados. “O crime organizado é um fenômeno novo, não se compara com a criminalidade que havia no passado”, disse.

Lewandowski criticou duramente a tentativa de equiparar facções criminosas a grupos terroristas, proposta inicialmente debatida na Câmara. “São dois tipos de crimes que têm uma natureza completamente diferente”, afirmou. Segundo ele, a medida poderia abrir espaço para interferência externa e afetar a soberania nacional. “Nós abriríamos um flanco muito grande e exporíamos a nossa soberania aos mais distintos tipos de ataques”, alertou.

Ele elogiou as mudanças feitas pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que, segundo o ministro, retomaram o espírito original do projeto. “Coincide em 90% com aquilo que nós propusemos”, disse.

Vetos, atos golpistas e Estado Democrático de Direito

Lewandowski também comentou o projeto de lei da dosimetria, que reduziu penas de condenados pelos atos golpistas e do ex-presidente Jair Bolsonaro, e afirmou que a análise dos vetos passará pelo Ministério da Justiça. O ministro foi enfático ao criticar a flexibilização das punições. “Na medida em que você ameniza as sanções contra esse tipo de atentado contra as instituições, que é gravíssimo, você pode estimular futuros atentados contra o Estado Democrático de Direito”, afirmou.

Ele lembrou que o Supremo Tribunal Federal já decidiu que não é possível conceder indulto ou anistia para crimes contra o Estado Democrático de Direito, ressaltando que a redução de penas pode, na prática, representar uma forma indireta de anistia.

Combate ao crime e infiltração na política

Na entrevista, Lewandowski também alertou para a infiltração do crime organizado no processo eleitoral e atribuiu responsabilidade direta aos partidos políticos. “Tem que apurar, saber quem é quem antes de dar uma legenda”, disse. Segundo ele, o Estado atua de forma repressiva, mas a prevenção começa na seleção dos candidatos e no controle do financiamento de campanhas.

Ao final, o ministro afirmou que a Polícia Federal tem atuado com autonomia no atual governo e que o combate ao crime organizado seguirá como prioridade, desde que respeitados os limites constitucionais. “O Estado não pode praticar crimes ao combater crimes”, concluiu.

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