Trabalho por aplicativo impulsiona queda da criminalidade em SP, diz estudo do MIT
Levantamento mostra que expansão do iFood reduz delitos em regiões de menor renda e amplia oportunidades econômicas
247 - A presença de plataformas de entrega nas grandes cidades paulistas tem desempenhado um papel significativo na redução de crimes, segundo uma análise inédita da economista Isadora Frankenthal, do Massachusetts Institute of Technology (MIT).
De acordo com o estudo, a atuação do iFood em municípios do estado de São Paulo contribuiu para diminuir em 10,4% os registros de criminalidade nas áreas onde o serviço passou a operar. O efeito é ainda mais intenso em bairros de menor renda, reforçando a relação entre geração de trabalho, inclusão econômica e queda de delitos.
A redução é mais expressiva entre crimes violentos nesses territórios vulneráveis: segundo Frankenthal, houve queda de 26,7% nessas ocorrências. A economista observa que a adesão de jovens a vagas de entrega funciona como alternativa concreta ao envolvimento com delitos impulsivos. “Normalmente, as pessoas não tendem a percorrer grandes distâncias para cometer este tipo de crime”, afirma.
O levantamento destaca também que as reduções são mais fortes nos horários com maior retorno financeiro para entregadores, como períodos de almoço e jantar. Entre crimes mais graves, o estudo indica que potenciais infratores deixam de agir quando o trabalho oferece ganho mais vantajoso.
A pesquisa analisou dados de 118 municípios paulistas com mais de 50 mil habitantes entre 2010 e 2019, período anterior à pandemia. Nesse intervalo, o iFood já dominava o mercado de entregas no estado e estava presente em todas as cidades avaliadas, que tiveram seus índices criminais confrontados com estatísticas da Secretaria de Segurança Pública paulista.
O impacto estimado pela economista corresponde, em média, a 529 crimes a menos por município a cada ano. O efeito se estende a delitos contra o patrimônio, incluindo aqueles cometidos com violência. A queda persiste por até cinco anos após a chegada da plataforma às regiões analisadas.
Antes da entrada do serviço, bairros mais pobres acumulavam cerca de 50% mais crimes per capita que as áreas mais ricas das mesmas cidades. A ampliação do trabalho por aplicativo, segundo o estudo, contribui para reduzir essa disparidade ao oferecer renda a um público formado majoritariamente por homens jovens de baixa escolaridade — o grupo mais associado a crimes de oportunidade, como furtos e roubos.
O debate ocorre no momento em que Câmara Municipal e Prefeitura de São Paulo discutem regras para o serviço de mototáxi na capital. O prefeito Ricardo Nunes (MDB) defende que a liberação pode elevar o número de mortes no trânsito, argumento que vem alimentando uma disputa jurídica prolongada.
A pesquisa, que integra a tese de doutorado de Frankenthal, deve ser submetida a periódicos acadêmicos nos próximos meses. No MIT, a economista tem concentrado seus estudos em temas ligados ao Brasil, especialmente na área de segurança pública e análise estatística.
Ela ressalta, no entanto, que os dados levantados não permitem concluir em detalhe como criminosos disfarçados de entregadores podem influenciar o aumento de delitos, fenômeno mais recorrente em grandes centros, como a capital paulista.
Para Luiz Guilherme Scorzafave, pesquisador do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e do Lepes (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social da FEA-RP/USP), o trabalho de Frankenthal se destaca pela robustez metodológica. “É muito interessante o fato de a pesquisa ter conseguido, a partir das informações da plataforma e da ocorrência de crimes, determinar também os horários e regiões onde a criminalidade caiu. É uma pesquisa ‘top’”, afirma.
O estudo também dialoga com levantamentos sobre remuneração de trabalhadores de aplicativos. Em análise realizada pelo economista Nelson Marconi, da Eaesp-FGV, profissionais enquadrados como Microempreendedores Individuais (MEI) ou conta própria com CNPJ na área de transporte receberam, em média, mais do que empregados com carteira assinada em 2024. Segundo os dados do IBGE utilizados na comparação, enquanto os trabalhadores formais do setor tinham rendimento de 0,88 (em escala em que a média é 1), os autônomos com CNPJ alcançavam 1,22.



