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Petróleo venezuelano é o motivo principal do bloqueio anunciado por Trump

Reservas estratégicas colocam a Venezuela no foco da política externa dos EUA, enquanto Washington amplia ações militares e pressões econômicas

Logo da estatal de petróleo venezuelana PDVSA, REUTERS/Marco Bello (Foto: Paulo Emílio)

247 - A campanha do presidente dos EUA, Donald Trump, contra o governo de Nicolás Maduro tem como um de seus eixos centrais o controle das vastas reservas de petróleo da Venezuela. Embora a Casa Branca sustente publicamente que suas ações visam combater o narcotráfico, bastidores diplomáticos e declarações do próprio Trump indicam que o interesse energético ocupa lugar prioritário na estratégia norte-americana para o país sul-americano.

A informação foi revelada em reportagem do jornal O Globo, que detalha como o petróleo venezuelano passou a ser tratado como ativo estratégico. A Venezuela detém cerca de 17% das reservas mundiais conhecidas de petróleo, o que a coloca no centro das disputas globais por segurança energética e influência regional.

Nesta semana, Trump anunciou um bloqueio naval total a “navios petroleiros sancionados” que partem ou se dirigem à Venezuela. A medida foi divulgada poucos dias após a apreensão de um petroleiro no Mar do Caribe que transportava petróleo bruto com destino a Cuba e à China. O presidente afirmou que ficaria com a carga interceptada, apesar de questionamentos jurídicos sobre sua autoridade para tal ação.

A iniciativa representa uma escalada significativa na ofensiva norte-americana contra o governo venezuelano. Nos últimos meses, a campanha incluiu ataques a embarcações, que, segundo a reportagem, resultaram na morte de ao menos 95 pessoas — ações consideradas ilegais por diversos especialistas em direito internacional.

O petróleo como promessa política

O interesse pelo setor energético venezuelano também tem sido explorado por setores da oposição ao governo Maduro. Em um discurso transmitido por vídeo a uma conferência empresarial em Miami, a líder opositora María Corina Machado destacou o potencial econômico do país diante de executivos e políticos norte-americanos, incluindo o próprio Trump. “Estou falando de uma oportunidade de US$ 1,7 trilhão (R$ 9,29 trilhões)”, afirmou María Corina, ao ressaltar as reservas de petróleo e gás da Venezuela.Ela acrescentou: “Abriremos tudo, exploração, transporte e refino, para todas as empresas”, mencionando também os recursos minerais e a infraestrutura energética do país.A mensagem vem sendo reiterada desde o início do ano. Em um podcast apresentado por Donald Trump Jr., filho mais velho do presidente, a opositora voltou a mencionar o que chamou de “potencial infinito” da Venezuela para empresas dos Estados Unidos.

Discurso público e interesses ocultos

Apesar das reiteradas justificativas oficiais de que as operações militares e a pressão diplomática têm como objetivo proteger os americanos do narcotráfico, especialistas apontam inconsistências nesse argumento. A Venezuela não é produtora de drogas, e grande parte dos narcóticos que transitam pelo país tem como destino o mercado europeu.

Nos bastidores, segundo autoridades atuais e antigas do governo dos EUA, a atenção está voltada para as reservas petrolíferas venezuelanas — as maiores do mundo. Esse foco se reflete tanto em negociações reservadas com o governo Maduro quanto em contatos com figuras da oposição.

Trump já declarou publicamente seu desejo de controlar o petróleo venezuelano. Em um discurso a republicanos na Carolina do Norte, em 2023, ele afirmou: “Quando saí, a Venezuela estava à beira do colapso. Nós a teríamos tomado, teríamos ficado com todo aquele petróleo, teria sido aqui do lado.”

Para analistas, o petróleo da Venezuela se encaixa em duas prioridades declaradas da política de segurança nacional de Trump: o domínio dos recursos energéticos e o controle do Hemisfério Ocidental. O país sul-americano possui mais de 300 bilhões de barris de petróleo, quase quatro vezes o volume existente nos Estados Unidos, e mantém laços profundos com a China, principal compradora do petróleo venezuelano.

“Quando o presidente Trump falou sobre a Venezuela e outros países comparáveis, ele sempre enfatizou a importância de os EUA terem acesso a esses recursos petrolíferos”, explicou Francisco R. Rodríguez, professor da Universidade de Denver e especialista na economia política venezuelana.

Pressão, negociações e riscos

Nos últimos meses, assessores de Trump discutiram formas de ampliar o acesso de empresas norte-americanas ao petróleo venezuelano. Richard Grenell, enviado especial para assuntos da Venezuela, chegou a liderar negociações diretas com Maduro. O presidente venezuelano teria oferecido abrir o setor petrolífero aos Estados Unidos além do acesso limitado concedido à Chevron, que opera no país sob licença específica.

A proposta, no entanto, foi rejeitada por Trump após conselhos de assessores que consideraram Maduro pouco confiável. Um grupo liderado por Marco Rubio, secretário de Estado e conselheiro de segurança nacional, defende abertamente a destituição do governo venezuelano pela força, argumentando que uma liderança alinhada ao livre mercado favoreceria empresas norte-americanas e reduziria a influência chinesa.

Enquanto isso, Maduro mantém o petróleo como ferramenta geopolítica. A China responde por cerca de 80% das compras do petróleo venezuelano e é vista como pilar de sustentação econômica diante das sanções impostas pelos Estados Unidos. Em abril, a vice-presidente Delcy Rodríguez solicitou, durante visita a Pequim, mais investimentos chineses no setor.

Autoridades norte-americanas indicam que novas apreensões de petroleiros venezuelanos podem ocorrer em breve, o que tende a reduzir significativamente as receitas do país. Segundo Tom Warrick, ex-funcionário do Departamento de Estado, “a estratégia do governo Trump agora se revela como sendo claramente voltada para esse fluxo de caixa”.

Especialistas alertam, no entanto, que uma eventual derrubada violenta do governo venezuelano pode gerar instabilidade prolongada, dificultando inclusive a atuação de grandes empresas petrolíferas ocidentais. Experiências recentes no Iraque e na Líbia mostram que intervenções militares nem sempre resultam em acesso rápido ou seguro aos recursos energéticos. 

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