Brasil mira novo ciclo de expansão mineral com avanços regulatórios e aumento de investimentos
Estudo aponta virada no setor com foco em minerais críticos essenciais à transição energética
247 - O Brasil pode estar prestes a inaugurar um novo ciclo de expansão na produção mineral, impulsionado por investimentos crescentes e pela criação de instrumentos regulatórios voltados ao setor. As conclusões fazem parte de um estudo desenvolvido em cooperação entre a Agência Nacional de Mineração (ANM) e o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea).
De acordo com o levantamento, o país reúne algumas das maiores reservas de minerais estratégicos para a transição energética — como lítio, grafita e terras raras —, mas ainda não converte esse potencial em protagonismo global. A tendência, porém, começa a mudar diante da retomada de investimentos em infraestrutura, pesquisa mineral e novas políticas públicas voltadas ao setor.
O diretor da ANM, Tasso Mendonça, destaca que a cooperação institucional é decisiva para fortalecer a base de dados e orientar decisões estratégicas. “Historicamente, o antigo DNPM sempre teve uma estrutura forte em economia mineral, mas ela foi perdendo força pois os aspectos regulatórios e de fiscalização se sobrepõem. Nesse sentido, a colaboração entre instituições é fundamental. Esse é o caminho para levarmos dados para apoiar a sociedade e o governo nas políticas públicas, além do setor financeiro em relação a investimentos”, afirma.
Para Mariano Laio, chefe da Divisão de Minerais Críticos e Estratégicos da ANM e coautor do estudo, há sinais claros de mudança no cenário recente. “Porém, desde 2023 observamos um grande aporte de recursos estrangeiros, especialmente em terras raras, lítio e grafita. Isso indica que estamos vivendo uma reversão, saindo do ciclo de baixo investimento para entrar em uma tendência de crescimento do setor”, avalia.
Demanda global em alta favorece países com grandes reservas
O documento aponta que a corrida mundial pela redução das emissões de carbono deve elevar substancialmente a demanda por minerais como cobre, níquel, manganês, lítio, grafita e terras raras. Esses elementos compõem tecnologias essenciais à transição energética, incluindo baterias, carros elétricos, turbinas eólicas e painéis solares.
Nesse cenário, países que detêm grandes reservas — como o Brasil — podem se beneficiar do acesso abundante e de baixo custo a insumos de alta qualidade, abrindo espaço para novas cadeias produtivas e avanços em reciclagem, refino e extração.
O especialista do Ipea e coautor do estudo, Rafael Leão, ressalta o peso do mercado internacional. “Europeus e norte-americanos estão muito preocupados com o domínio chinês em toda a cadeia produtiva mineral. Apenas países como o Brasil, que possuem reservas de grande volume, podem se colocar como elemento capaz de aliviar essa pressão no mercado global causada pela dependência da China”, analisa.
Perda de posição global e sinais de virada
Embora possua reservas expressivas, o Brasil perdeu terreno no mercado internacional nas últimas décadas devido à baixa intensidade de investimentos. A exceção foi o lítio, cuja produção cresceu de forma mais significativa. Entre 2017 e 2022, as exportações brasileiras avançaram menos que a média mundial, retornando aos níveis de 2007.
Mas a partir de 2023 o quadro começou a mudar. A produção de cobre aumentou 26%; a de lítio, 93%; a de manganês, 52%; e a de zinco, 25%. No mesmo período, o volume de lítio produzido dobrou em relação ao ano anterior. Após quase dez anos de retração, os investimentos em pesquisa mineral voltaram a crescer desde 2021, sobretudo nos minerais estratégicos.
Leão avalia que o país reúne condições para ocupar novos espaços no mercado global. “Temos um parque industrial estagnado, e é muito difícil criar condições de reverter essa situação por conta própria. Por outro lado, a Europa e os Estados Unidos têm volumes de demanda imensos. Talvez seja o caso do Brasil se posicionar perante eles como um hub de produção e processamento mineral associado às suas cadeias. Olhar para o mercado brasileiro é importante, mas essa visão para fora também é central”, destaca.
Avanços regulatórios e novas fontes de financiamento
O estudo ressalta que o ambiente regulatório brasileiro também avançou. Entre as medidas recentes, destacam-se:
- Decreto nº 10.657/2021, que prioriza o licenciamento ambiental de projetos com minerais estratégicos
- Decreto nº 11.108/2022, que institui a Política Mineral Nacional e o Conselho Nacional de Política Mineral
- PL 2.780/2024, em tramitação, que propõe a Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos (PNMCE)
Além disso, BNDES e Finep disponibilizaram R$ 5 bilhões para projetos de transformação mineral, refino, desenvolvimento tecnológico e reciclagem. A Portaria Normativa nº 120/2025, do Ministério de Minas e Energia, criou regras para a emissão de debêntures incentivadas voltadas ao financiamento de projetos ligados à transição energética.
Caminho para um ciclo virtuoso
Para os autores do estudo, a combinação entre aumento de investimentos, reforço regulatório, financiamento e expansão da pesquisa indica que o país tenta construir um ambiente favorável a um ciclo duradouro de crescimento no setor mineral.
O relatório conclui que, sem ampliar de maneira consistente sua capacidade extrativa e produtiva, o Brasil terá dificuldade para ocupar posições de destaque no processamento e na metalurgia de minerais críticos. Entretanto, caso consiga alinhar seu potencial geológico às oportunidades globais, poderá se firmar como ator relevante na geopolítica da transição energética.



