Debate sobre segurança pública exige revisão conceitual no PT, diz Tarso Genro
Ex-ministro defende ação policial com critérios, rejeita redução da maioridade penal e alerta para avanço do crime organizado
247 - O ex-ministro da Justiça Tarso Genro, que comandou a pasta durante o segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, avalia que o debate sobre segurança pública precisa ser enfrentado com mais profundidade pelo campo progressista. Para ele, o Partido dos Trabalhadores deve revisar concepções históricas que associam automaticamente a criminalidade a fatores sociais e assumir uma postura mais clara em defesa da ação estatal.
As declarações foram dadas em entrevista ao jornal O Globo, na qual Tarso analisou propostas discutidas recentemente em um seminário do PT, incluindo a recriação do Ministério da Segurança Pública a partir da divisão do atual Ministério da Justiça.
Proposta de novo ministério e limites da disputa eleitoral
Tarso afirmou que a criação de uma estrutura específica para a segurança pública não deve ser tratada como bandeira eleitoral. “Essa questão não pode ser objeto de disputa eleitoral”, disse. Segundo ele, o tema envolve diretamente a vida cotidiana da população e a capacidade de circulação no território. "Acabou ocorrendo uma certa ausência da União e temos que preencher esse vazio rapidamente, o que exige uma estrutura específica no governo", defendeu
O ex-ministro alertou para a confusão crescente entre segurança pública e segurança nacional, citando o uso do conceito de “narcoguerrilha” pelo atual presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, para justificar interferências externas. Para Tarso, esse tipo de abordagem ameaça a soberania e reforça a necessidade de uma resposta institucional clara por parte do Estado brasileiro. .
Polícia firme, mas com critérios claros
Ao comentar a aprovação popular de operações policiais letais, como a que deixou 122 mortos no Rio de Janeiro, Tarso rejeitou a ideia de que o PT deva aderir a um discurso que naturalize mortes. “Se o PT adotasse uma posição como essa, de querer uma polícia que mate, estaríamos nos alinhando a países como a Alemanha nazista e a Rússia stalinista”, afirmou.
Ele defendeu uma revisão conceitual dentro do partido. “Nós temos que superar no PT uma convicção, que vem dos anos 1960 e 1970, de identificar sempre os criminosos com problemas de natureza social. Até porque os piores criminosos não vêm de baixo”, declarou. Em seguida, acrescentou: “Precisamos de uma polícia firme para agir, inclusive com violência, contra criminosos armados. Mas isso é diferente do uso da força sem nenhum critério, como ocorreu no Rio”.
Drogas, mercado ilegal e controle do território
Tarso também comentou a repercussão de uma fala de Lula que se referiu a traficantes como “vítimas” dos usuários de drogas. Segundo ele, a declaração buscou evidenciar a lógica econômica do tráfico. “Acho que ele quis dizer que os traficantes muitas vezes são alimentados por um mercado altamente lucrativo para alguns”, afirmou.
Para o ex-ministro, o enfrentamento passa por interromper a entrada de drogas no país e investir em educação do consumidor. Sobre a legalização, ponderou: “Isso precisa ser discutido quando o governo tiver maior controle sobre a entrada dessas substâncias no território”.
Críticas à redução da maioridade penal
Questionado sobre a tentativa de incluir a redução da maioridade penal na PEC da Segurança, Tarso foi categórico. “Acho isso contraproducente”, disse. Ele defendeu um projeto elaborado no Ministério da Justiça em 2010 para a criação de penitenciárias socioeducativas destinadas a jovens entre 18 e 25 anos.
“Continua sendo uma prisão, mas com condições de formação profissional e separados do convívio com as lideranças criminosas, que muitas vezes cooptam esses jovens para o crime”, explicou. Segundo ele, a proposta busca reduzir a reincidência criminal.
Crime organizado e infiltração no Estado
Ao analisar as dificuldades atuais de cooperação entre União e estados, Tarso apontou o avanço do crime organizado dentro das estruturas políticas. “Hoje o crime organizado tem base política, formada a partir de grupos de parlamentares que recebem verbas polpudas do Estado”, afirmou.
No caso do Rio de Janeiro, avaliou que “o crime penetrou no Estado em proporções alarmantes”, o que inviabiliza modelos de colaboração semelhantes aos adotados na época das Unidades de Polícia Pacificadora. Segundo ele, naquele período, o principal problema foi a expansão acelerada das UPPs sem a implantação simultânea de políticas sociais.
Segurança pública e alianças políticas para 2026
Ao tratar das articulações políticas para 2026, Tarso afirmou que o foco deve ser a defesa da Constituição e o aprofundamento do debate sobre segurança pública. “Tem que excluir os partidos em que predomine a corrupção e que tenham propensão a proteger o crime organizado”, disse.
Sobre possíveis alianças, adotou um tom pragmático. “Se chegar em determinado momento e o Kassab propuser entrar na aliança, com pessoas a indicar, eu rejeitaria? Não. Eu ia verificar qual é a pretensão, quais são as alianças regionais que podemos fazer”, concluiu.



