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“A direita liberal quer se livrar de Bolsonaro”, diz Altman

Jornalista analisa em entrevista defensiva do bolsonarismo, dilema de Tarcísio e disputa pela liderança da direita nas eleições de 2026. Assista na TV 247

Breno Altman e Jair Bolsonaro (Foto: Brasil247 | REUTERS/Carla Carniel)

247 - A prisão de Jair Bolsonaro e o início do cumprimento de sua pena, são, para Breno Altman, um ponto de inflexão na correlação de forças à direita no país. Em sua avaliação, o episódio expõe limites de mobilização do bolsonarismo e acelera a disputa pela liderança do campo conservador nas eleições presidenciais de 2026. Em entrevista ao programa Bom Dia 247, Altman afirmou que a extrema direita já trata Bolsonaro, condenado a mais de 27 anos no caso da trama golpista, como figura deslocada da disputa central e que, nesse contexto, a direita liberal tenta reassumir o comando político do campo conservador. Segundo o jornalista, “essa direita liberal talvez queira se livrar do Bolsonaro mais do que a esquerda, porque eles precisam se livrar do Bolsonaro para tentar reconstruir sua força política”.

Reação do bolsonarismo e perda de capacidade de mobilização

Altman avalia que a forma da prisão de Bolsonaro não surpreendeu do ponto de vista jurídico, já que o trânsito em julgado da condenação indicava a transferência da prisão preventiva para o sistema penal. A surpresa, para ele, está no desfecho político: a reação do bolsonarismo à medida foi restrita.

Segundo o jornalista, a vigília em solidariedade ao ex-presidente, por si, não poderia justificar a prisão preventiva, que só se sustenta, em seu entendimento, na tentativa de rompimento da tornozeleira. A partir desse marco, o que mais chama sua atenção é a resposta do campo bolsonarista. Ele observa que “a reação do bolsonarismo perdeu muita intensidade, né? Nós tivemos uma reação muito fraca à inserção de Jair Bolsonaro no sistema penal”.

Para Altman, o núcleo bolsonarista mantém apoio ao ex-presidente, mas sem disposição equivalente de mobilização. Na formulação que apresentou, essa base parece considerar que esse é um jogo jogado. Bolsonaro vai para prisão e sua eventual libertação, fica dependendo da política e não da justiça. Fica dependendo de decisões do parlamento e mais do que tudo fica dependendo do resultado eleitoral do próximo ano”.

“Bolsonaro é carta fora do baralho”, mas ainda controla os votos

Na leitura de Altman, o esvaziamento da capacidade de mobilização não significa desaparecimento do capital eleitoral do bolsonarismo. Ele sustenta que a prisão preventiva, somada ao comportamento do ex-presidente e à tentativa de romper a tornozeleira, colocou a extrema direita “numa situação de muito constrangimento” e derrubou ainda mais a disposição de ir às ruas.

Mesmo assim, Altman afirma que a força eleitoral segue concentrada nesse campo. Ele sintetiza esse quadro ao dizer que já existe “um consenso na extrema direita de que Bolsonaro é carta fora do baralho, que ele é um importante cabo eleitoral, mas que a disputa presidencial de 2026 não passa principalmente por ele, embora ele seja um jogador fundamental porque ele tem votos”.

A partir desse diagnóstico, o jornalista considera que Bolsonaro e seus filhos — com exceção de Michele Bolsonaro — não aparecem, hoje, como nomes com viabilidade para ocupar a cabeça de chapa presidencial. “Eles não reuniram as condições político-sociais e eleitorais para disputarem com alguma chance a a a refrega, a luta eleitoral do próximo ano. O único nome do clã que mantém aparentemente índice eleitoral é Michele Bolsonaro”, afirma.

A disputa pela liderança da direita: Tarcísio como peça central

É nesse cenário que Altman introduz o papel da direita liberal e de Tarcísio de Freitas. Ele lembra que partidos como PSDB, MDB e o antigo PFL, hoje União Brasil, perderam a hegemonia sobre o campo conservador: “essa direita liberal, ela foi destituída do comando do campo conservador por Bolsonaro e virou uma força política residual na sociedade brasileira, sem capacidade de disputar a eleição presidencial”.

Segundo Altman, essa direita liberal é “vocalizada especialmente pelos meios de comunicação” e depende da superação do protagonismo bolsonarista para se recompor. Daí sua formulação central: “Enquanto o Bolsonaro tiver protagonismo, a direita liberal não tem lugar ao sol, tá? Ela precisa se livrar do Bolsonaro e ela precisa atrair certas lideranças do bolsonarismo para um outro campo, o campo da direita liberal”.

Dentro dessa estratégia, Tarcísio de Freitas ocupa posição-chave. Altman resume a operação em curso: “É o que eles tentam fazer com o Tarcísio, né? Eles têm simpatia pelo Tarcísio. Evidente que o Tarcísio é o candidato a Faria Lima. O Tarcísio é o preferido dos grandes meios de comunicação e dos empresários”. 

Tentativa de “desbolsonarizar” Tarcísio e limites desse movimento

Para Altman, a direita liberal busca “desbolsonarizar” Tarcísio sem perder sua conexão com o eleitorado de Bolsonaro. “Agora eles querem desbolsonarizar o Tarcísio. Eles querem que o Tarcísio não bata mais continência pro Bolsonaro. Eles querem que o Tarcísio beije a cruz, que o Tarcísio se converta a este campo liberal e bata continência diretamente para a Faria Lima e pros meios liberais de comunicação. Essa é a pressão que eles exercem sobre Tarcismo”, afirma.

O jornalista, porém, vê limites claros para essa transição. Ele define o governador de São Paulo como produto direto do bolsonarismo: “Tarcísio é uma criatura do bolsonarismo”. Em sua análise, o vínculo político entre ambos é estrutural, o que dificulta uma ruptura aberta.

Altman projeta que o governador tenderá a manter posição intermediária: “Eu acho que o Tarcísio ele vai ficar nessa postura nem maçã, nem pera, nem peixe, nem carne o tempo todo. Ele é um bolsonarista que se dispõe a trabalhar com a direita liberal e a direita liberal vai ter que engolir esse perfil ou abandonar o Tarcísio e buscar outra opção”.

Cálculo eleitoral de Tarcísio entre 2026 e 2030

A decisão sobre disputar ou não a Presidência em 2026 é, para Altman, um cálculo de risco pessoal e político para Tarcísio. Ele lembra que o governador teria um caminho menos arriscado ao tentar a reeleição em São Paulo e projetar eventual candidatura presidencial em 2030. Por isso, descreve o movimento esperado pela direita liberal como um salto sem garantias.

Segundo o jornalista, “o Tarcísio tem que fazer muita conta, né? Estão propondo a ele um pulo de um trampolim de 10 m sem garantia de que a piscina esteja cheia”. Ele observa que o governador é hoje franco favorito à reeleição no estado e que trocar esse cenário por uma disputa presidencial contra Lula, em meio às tensões entre direita liberal e bolsonarismo, envolve risco elevado: “É uma decisão difícil, não? É uma decisão difícil porque é muito, mas muito arriscado, não é?”.

Frente conservadora ampla ou fragmentação da direita

Na hipótese de Tarcísio aceitar a candidatura presidencial, Altman vê a possibilidade de composição de uma frente conservadora ampla, semelhante à que sustentou Ricardo Nunes em São Paulo. O jornalista recorda que, na capital paulista, houve aliança que uniu MDB e bolsonarismo, com o ex-presidente atuando como cabo eleitoral secundário. Ele projeta esforço para reproduzir algo semelhante em nível nacional: “Eu acho que precisa repetir o cenário do Ricardo Nunes em São Paulo no ano passado, uma frente conservadora que vai da da do MDB até até o bolsonarismo”.

Essa frente, em sua análise, permitiria à direita liberal recuperar capacidade de comando, preservando ao mesmo tempo o peso eleitoral do bolsonarismo. Tarcísio, nesse desenho, seria o nome com maior potencial de unificação: “O único candidato que unificaria a direita toda seria o Tarcísio”.

Caso o governador permaneça em São Paulo e não se lance à Presidência, Altman prevê outro quadro. “Sem o Tarcísio, eu acho que é o cenário de ter duas, três ou até quatro candidaturas de direita, cada qual tentando chegar no segundo turno com a aposta de que no segundo turno toda a direita se unifica contra Lula, não é?”, afirma.

Fragmentação pode fortalecer a direita, avalia Altman

Altman considera que a fragmentação da direita no primeiro turno pode, paradoxalmente, ampliar o campo conservador. “Eu temo que a tática da fragmentação nessa altura seja mais eficaz para a direita. O motivo, segundo ele, é a existência de um eleitorado de direita que rejeita Bolsonaro, mas mantém rejeição ao PT e a Lula.

Ele descreve esse grupo da seguinte forma: “Há eleitores de direita a essa altura do campeonato que são antibolsonaro, não querem saber de bolsonarismo, são hoje mais antibolsonaro do que antiLula. Há eleitores com esse perfil. As pesquisas mostram isso”. Em cenário de múltiplas candidaturas à direita, esse eleitorado pode ser atraído por nomes que não sejam identificados diretamente com o bolsonarismo, como Ratinho Júnior, citado como exemplo.

Na hipótese apresentada por Altman, um eleitor de direita poderia escolher um candidato não bolsonarista no primeiro turno e, a partir da campanha, ser novamente atraído pelo antipetismo no segundo. Ele resume esse movimento assim: “E aí a dinâmica da campanha pode levar esse eleitor que votou no Ratinho Júnior no primeiro turno a se alimentar durante a campanha do antipetismo e no segundo turno fechar o nariz e votar num candidato unificado da direita contra o presidente Lula”.

Dilema estratégico também para a esquerda

Ao longo da entrevista, Altman ressaltou que não está definido qual cenário é mais favorável ao governo Lula: uma direita unificada em torno de Tarcísio ou uma direita fragmentada no primeiro turno. “Eu tenho hoje dúvidas se o melhor cenário para esquerda, seria a reabilitação da direita não bolsonarista”, afirma. Ele pondera que a oferta de diferentes candidaturas conservadoras pode ampliar o alcance da direita entre eleitores que hoje rejeitam Bolsonaro.

No balanço que apresentou, o jornalista conclui que a prisão de Bolsonaro acelera um rearranjo em curso desde julho, com o bolsonarismo em defensiva e a direita liberal em busca de uma nova referência. Nesse processo, Tarcísio de Freitas aparece, ao mesmo tempo, como aposta central desses setores e como liderança diante de um impasse próprio. Para Altman, o resultado dessa disputa interna à direita, somado às decisões estratégicas do governo e da esquerda, será elemento decisivo para a disputa presidencial de 2026. Assista: 


 

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