Estratégia de segurança dos EUA coloca China como rival central e amplia lógica de contenção global
Para o analista James Wood, o novo documento de Washington assume competição aberta com a China e adota postura intervencionista
247 – A divulgação da Estratégia de Segurança Nacional (NSS) de 2025 pela Casa Branca expôs, segundo o analista político James Wood, a visão real de Washington sobre o mundo. Ele afirma que o texto é “uma das janelas mais claras até agora sobre como os Estados Unidos realmente enxergam o cenário internacional”.
Wood destaca que o documento abandona o discurso tradicional sobre uma “ordem baseada em regras” e adota um tom direto, “sem rodeios e extremamente revelador”.
China é tratada como principal rival estratégico e potência de nível semelhante
Para o analista, o trecho mais significativo é o reconhecimento explícito de que China e Estados Unidos são agora “potências quase equivalentes”.
Segundo Wood, a NSS admite pela primeira vez que a antiga política de engajamento com a China “falhou”, porque Pequim não assumiu o papel subordinado que Washington imaginava.
A interpretação do especialista é clara: os EUA pretendem ampliar a contenção em várias frentes. Ele observa que a estratégia aponta para “mais dissuasão, mais pressão e mais expansão militar ao redor da China”, transformando a Primeira Cadeia de Ilhas em “uma muralha de força”, ao mesmo tempo em que exige que aliados arquem com parte crescente dos custos.
No campo econômico, Wood afirma que não há ruptura total, mas um engajamento controlado. Para ele, trata-se de cooperação apenas em áreas que não afetem o poder norte-americano, enquanto o restante será objeto de competição, restrição ou bloqueio. “Isso é contenção de longo prazo sob outro nome”, resume.
Retorno explícito da Doutrina Monroe sob o chamado ‘corolário Trump’
Wood aponta que o documento também marca o retorno aberto da Doutrina Monroe, reformulada como um “corolário Trump”.
A mensagem é direta: a América Latina deve permanecer sob influência dos Estados Unidos, e a presença de potências externas — especialmente a China — passa a ser vista como indesejável.
Em sua leitura, isso significa mais atividade naval, mais pressão sobre governos latino-americanos e uma postura mais dura em relação a fronteiras e migrações. Wood define o movimento como “uma declaração muito explícita de dominação hemisférica”.
Avaliação dos EUA sobre a Europa é severa e intervencionista
Um dos trechos mais surpreendentes para Wood é a análise da situação europeia.
O documento afirma que a Europa enfrenta “apagamento civilizacional” e pode se tornar “irreconhecível” em breve. Critica o excesso regulatório, a estagnação econômica, as mudanças demográficas e a fragmentação política.
Wood destaca especialmente a afirmação de que os EUA desejam “cultivar resistência” dentro dos países europeus para alterar sua direção política — algo que ele descreve como engenharia política aberta contra aliados.
A NSS também culpa líderes europeus pela prolongação da guerra na Ucrânia e alerta para o aumento da dependência europeia em relação à China e à Rússia. Para Wood, essa é “a postura mais confrontacional já registrada pelos EUA em um documento oficial sobre a Europa”.
Oriente Médio deixa de ser centro estratégico e passa a ser zona de investimentos
Segundo Wood, o Oriente Médio perdeu prioridade na política externa dos EUA. Ele afirma que Washington agora trata a região mais como uma área de investimento do que como um palco de disputas geopolíticas centrais.
Os EUA buscam cooperação em segurança, parcerias tecnológicas e operações de contraterrorismo, mas não pretendem repetir “outra geração de guerras longas e desordenadas”. Para o analista, essa abordagem é “notavelmente mais pragmática e menos ideológica”.
África é vista sob ótica de recursos estratégicos, não de ajuda humanitária
A seção sobre África é curta, mas clara. Wood observa que os EUA querem acesso a minerais, energia e influência, sobretudo para conter a presença chinesa.
Segundo ele, os EUA estão substituindo o discurso humanitário por uma abordagem de “extração estratégica”. Como resume Wood, “não há nada de sutil nisso”.
Doutrina real dos EUA é exposta de forma direta
Wood identifica uma frase que, em sua opinião, sintetiza toda a lógica da estratégia:
“Os Estados Unidos não podem permitir que qualquer nação se torne tão dominante a ponto de ameaçar nossos interesses.”
Para ele, essa é “a formulação mais clara da hegemonia americana que vi em anos” — sem ornamentações morais ou justificativas multilaterais.
Clima deixa de ser prioridade e liderança é praticamente entregue à China
A NSS rejeita metas de emissões líquidas zero e políticas guiadas pela agenda climática.
Wood interpreta isso como um recuo definitivo da liderança climática norte-americana. Ele afirma que os EUA parecem confortáveis com a ideia de deixar a China ocupar esse espaço, especialmente porque Pequim já domina setores como energia solar, baterias, veículos elétricos e tecnologias de transição energética.
Para ele, essa posição equivale quase a admitir que os EUA “não conseguem acompanhar esse ritmo”.
Rivalidade China–EUA torna-se permanente e independente de governos
Wood considera que a estratégia consolida uma competição estrutural de longo prazo. Os Estados Unidos, segundo ele, assumem compromisso de:
– intensificar a pressão militar ao redor da China
– coordenar aliados para resistir ao avanço econômico chinês
– disputar influência global da América Latina à África
– defender a supremacia tecnológica norte-americana a qualquer custo
Ele conclui que esta é “a estratégia mais adversarial já registrada contra a China em um documento oficial dos EUA”.
Mudança de tom: fim do multilateralismo retórico e adoção explícita de esferas de influência
Wood avalia que a principal mudança não está apenas no conteúdo, mas no tom. Estratégias anteriores escondiam ambições de poder sob discursos de valores compartilhados. A NSS de 2025 não faz isso.
Em vez disso, adota abertamente a lógica das esferas de influência, transfere custos para aliados, incentiva resistência política dentro de países parceiros e afirma de forma direta a primazia norte-americana.
Para o analista, trata-se de uma “visão de mundo centrada na competição, não na coexistência”.
EUA organizam sua estratégia global em torno da ascensão chinesa
Wood sintetiza o significado da NSS afirmando que ela projeta um mundo no qual:
– a China é o rival central
– a Europa está “derivando” e precisa ser corrigida
– a América Latina deve retornar ao controle dos EUA
– a África se torna campo de disputa por recursos
– o Oriente Médio é monetizado
– a responsabilidade climática é abandonada
– a hegemonia norte-americana governa toda a política externa
E, segundo ele, ao chamar a China de “potência quase equivalente”, os Estados Unidos finalmente admitem o que evitaram por anos: a ascensão chinesa é irreversível e agora reorganiza toda a estratégia global de Washington.



