Anvisa avalia ampliação do uso medicinal da Cannabis
Proposta permite importação da planta, expande vias de administração e altera regras para medicamentos à base de Cannabis
247 - A Agência Nacional de Vigilância Sanitária discute uma atualização ampla das normas que regulam o uso medicinal de produtos derivados da Cannabis no Brasil. A revisão inclui novas vias de administração, alteração no modelo de importação e mudanças nas regras para registro e comercialização de medicamentos. As discussões ocorreram nesta quarta-feira (10), mas foram interrompidas por pedido de vista do diretor Thiago Campos. As informações são da Folha de São Paulo.
A proposta modifica a resolução de 2019 ao permitir, entre outros pontos, o registro de medicamentos para uso bucal, sublingual e dermatológico. A norma atual limita as vias de administração às formas oral e inalatória. O novo texto também abre caminho para autorizar a importação da espécie vegetal Cannabis sativa L., além do extrato da planta, do fitofármaco canabidiol (CBD) e de produtos intermediários ou a granel.
Mudança regulatória pode ampliar mercado e acesso
As alterações impactam diretamente os medicamentos vendidos em farmácias, que passam por avaliação sanitária da Anvisa. Diferentemente disso, a agência mantém a possibilidade de importação excepcional para uso individual, prática ainda utilizada por pacientes e, frequentemente, respaldada por decisões judiciais. O pedido de vista suspendeu o julgamento. Pelo regimento da Anvisa, o diretor tem duas reuniões ordinárias para apresentar seu posicionamento.
Ampliação das vias de administração e importação
O diretor Rômison Mota, relator do processo, propõe restringir a importação excepcional de produtos sem registro. A nova regra prevê autorização apenas quando não existir no Brasil medicamento regularizado com “mesma forma farmacêutica e concentração”. Para ele, a mudança reforça a segurança sanitária.
“É fundamental, sob o ponto de vista de segurança da sociedade, que sejam priorizadas iniciativas que ampliem o acesso dos pacientes apenas a produtos regularizados”, afirmou. Mota destacou que o cenário de escassez, que justificou a flexibilização em 2015, foi superado. A Anvisa registra atualmente 33 produtos de canabidiol e 16 extratos de Cannabis.
Indicações de THC acima de 0,2% e critérios de uso
O texto também amplia o uso terapêutico de medicamentos com concentração superior a 0,2% de THC. Hoje, essa categoria se restringe a casos irreversíveis ou terminais. A proposta inclui pacientes com “doenças debilitantes graves”, como dor neuropática crônica.
A Anvisa mantém contraindicações para menores de 18 anos, gestantes e lactantes. O profissional prescritor — médico ou dentista — deve ainda avaliar riscos para idosos acima de 65 anos e pacientes com histórico de dependência ou uso não medicinal da planta.
Debate sobre cultivo segue em processo separado
O tema do cultivo da Cannabis no Brasil continua sendo analisado em outro processo. Por decisão do STJ, a Anvisa e outros órgãos federais devem apresentar até março um regulamento para o plantio com fins exclusivamente medicinais e farmacêuticos. Em novembro, a Embrapa recebeu autorização para pesquisar a planta.
Setor farmacêutico vê oportunidade de avanço
Durante a reunião, entidades do setor manifestaram apoio às mudanças. Carolina Sellani, representante da Abifiqui, avaliou que a norma de 2019 “respondeu a demandas urgentes”, enquanto a nova resolução cria “janela clara de oportunidade para estimular produção local”. Já Rosana Mastellaro, diretora do Sindusfarma, ressaltou que a proposta favorece continuidade de pesquisas e investimentos, ampliando o acesso a produtos com qualidade, segurança e eficácia.
Proposta também altera regras de marketing e rotulagem
O relatório prevê ainda mudanças na publicidade, hoje proibida em qualquer circunstância. O texto autoriza divulgação restrita a prescritores e farmacêuticos. Também permite nome comercial para os medicamentos, desde que sem termos estrangeiros ou referências terapêuticas diretas. As embalagens não poderão usar expressões como “óleo de Cannabis”, “óleo de CBD”, “full spectrum”, “broad spectrum” ou “extrato completo”.
Apesar dos avanços, o uso de produtos à base de Cannabis segue restrito a pacientes sem alternativas terapêuticas eficazes, e organizações destacam que o acesso ainda é limitado, mesmo com a ampliação do número de medicamentos regularizados no país.



