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Moraes vota para condenar cinco réus e absolver delegado da PF em julgamento da trama golpista

Ministro detalha atuação do núcleo 2 e aponta uso indevido da máquina pública após as eleições de 2022

Ministro Alexandre de Moraes (Foto: Antonio Augusto/STF)

247 - O Supremo Tribunal Federal (STF) avançou no julgamento do chamado núcleo 2 da trama golpista investigada após as eleições de 2022, com o voto do ministro Alexandre de Moraes pela condenação de cinco dos seis réus acusados de integrar uma organização criminosa voltada à manutenção do ex-presidente Jair Bolsonaro no poder, mesmo após a derrota nas urnas. O magistrado também votou pela absolvição do delegado da Polícia Federal Fernando de Sousa Oliveira.

Segundo a denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR), os acusados atuaram de forma coordenada em ações de monitoramento e neutralização de autoridades públicas, além de participarem da elaboração de um decreto que previa a adoção de medidas excepcionais no país. A acusação também aponta tentativas de interferência no processo eleitoral, com foco em impedir a votação de eleitores, especialmente na região Nordeste.

O núcleo 2 é composto por seis réus: Fernando de Sousa Oliveira, delegado da Polícia Federal e ex-secretário-executivo da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal; Marcelo Costa Câmara, coronel da reserva e ex-assessor de Jair Bolsonaro; Filipe Garcia Martins Pereira, ex-assessor especial de Assuntos Internacionais; Marília Ferreira de Alencar, ex-diretora de Inteligência do Ministério da Justiça; Mário Fernandes, general da reserva e ex-secretário-geral da Presidência; e Silvinei Vasques, ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal.

Voto de Moraes

Antes de entrar no mérito das acusações, Alexandre de Moraes rejeitou questionamentos processuais levantados pelas defesas, como a alegação de incompetência do STF para julgar o caso e supostos prejuízos decorrentes do volume de provas reunidas. Em seguida, passou a examinar individualmente a conduta atribuída a cada réu.

“A organização criminosa planejava, desde meados de 2020, a sua manutenção do poder”, afirmou o ministro. Em outro trecho, acrescentou: “Uma sucessão de atos executórios, todos eles relacionados entre si, demonstra a forte atuação dessa organização criminosa. Tendo esses réus participado de pelo menos seis momentos importantes nessa tentativa de consumação da perpetuação de poder de um grupo político que se tornou uma verdadeira organização criminosa no país”.

Ao tratar da atuação do general da reserva Mário Fernandes, Moraes destacou a postura do réu diante do cenário político. “É impressionante como essa confusão mental, na mente do réu, faz com que se tente justificar uma atitude golpista, um atentado contra o Estado Democrático de Direito”, disse, ao apontar que o acusado se colocava como um “salvador da pátria” e difundia ataques ao sistema eleitoral.

Atuação da Polícia Rodoviária Federal

O ministro também dedicou parte de seu voto à análise das operações da Polícia Rodoviária Federal no segundo turno das eleições de 2022. Segundo Moraes, houve desvio de finalidade e utilização da máquina estatal em benefício do grupo político investigado.

“Nós sabemos que não é normal, não é legal a utilização da Polícia Federal para produzir boletins de inteligência com base em votação para que a operação seja realizada pela Polícia Rodoviária Federal para obstruir só determinados eleitores tendentes a votar num candidato”, afirmou. Ele ainda rebateu o argumento de que as ações tinham como objetivo o combate ao crime organizado e à compra de votos. “Não é nem função da Polícia Rodoviária Federal”, ressaltou.

Em outro momento, o ministro foi enfático ao criticar a conduta institucional: “Então, claramente houve aqui um desvio de finalidade absolutamente ilícito para auxiliar um determinado grupo político que se transformou em organização criminosa para se manter no poder. Talvez, ministro Zanin, [esse seja] um dos momentos mais vexatórios da história de uma instituição respeitada como a Polícia Rodoviária Federal”.

Posição de Cármen Lúcia e denúncia da PGR

Durante o julgamento, a ministra Cármen Lúcia também se manifestou, destacando o impacto das condutas sobre os valores profissionais e democráticos. “O golpe é isso, é golpear uma estrutura organizada posta numa Constituição”, afirmou. Em seguida, completou: “É muito melancólico a gente ver que as pessoas numa convivência social, num convivência política, não respeitam o Estado de Direito, que vem para impedir que a ânsia por cargos, a ânsia por poder”.

A ministra ainda enfatizou a importância da ética no serviço público. “É importante que não se desconsidere o que são os valores de dignidade profissional, de ética nas carreiras, e que é preciso que realmente se tenha um cuidado com isso. Porque, como eu já lembrei mais de uma vez, a democracia vive do princípio da confiança”.

De acordo com a PGR, o grupo foi responsável por gerir as principais iniciativas da organização criminosa, incluindo o uso das forças policiais para sustentar o ex-presidente no poder, a coordenação do monitoramento de autoridades, a interlocução com lideranças ligadas aos atos de 8 de janeiro de 2023 e a elaboração da chamada minuta do golpe. Os réus respondem por cinco crimes: golpe de Estado, abolição do Estado Democrático de Direito, dano qualificado, deterioração de patrimônio tombado e organização criminosa.

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