Após Zambelli, Motta se vê obrigado a cassar mandato de Ramagem
Anulação de votação sobre mandato reacende tensão entre Legislativo e STF e coloca em xeque caso Alexandre Ramagem
247 - A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de anular a votação da Câmara dos Deputados que manteve o mandato da deputada Carla Zambelli (PL-SP) provocou um novo foco de tensão política em Brasília. A medida amplia a pressão sobre o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), e abre um impasse institucional que pode atingir diretamente a situação do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), também condenado pelo Judiciário, informa a Folha de São Paulo.
Segundo parlamentares, a determinação de Moraes coloca Motta diante de um dilema delicado: cumprir a ordem judicial, contrariando a oposição, ou insistir na autonomia do Legislativo, correndo o risco de aprofundar o desgaste com o STF e com parlamentares governistas. Até a noite de quinta-feira (11), o presidente da Câmara não havia se manifestado publicamente sobre a decisão.
A anulação da votação, ocorrida um dia após a Câmara ter decidido manter o mandato de Zambelli, gerou reações imediatas de líderes partidários. O líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), atacou duramente o ministro do STF, afirmando que Moraes é um “ditador psicopata” que passa por cima do Poder Legislativo. Em sentido oposto, o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ) manifestou apoio à decisão do magistrado, reforçando a legitimidade da atuação do Supremo.
Aliados de Hugo Motta relatam que o presidente da Câmara se encontra em uma posição especialmente sensível porque a ordem judicial foi direcionada nominalmente a ele. Embora a decisão inicial de Moraes não preveja punições em caso de descumprimento, parlamentares avaliam que eventuais sanções podem ser impostas caso a determinação não seja executada.
Carla Zambelli foi condenada, em maio, à perda do mandato e a dez anos de prisão por envolvimento na invasão do sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com auxílio do hacker Walter Delgatti Neto, que também foi condenado. Após a sentença, a deputada deixou o Brasil e atualmente está presa na Itália. Mesmo assim, na noite de quarta-feira (10), a Câmara havia decidido manter seu mandato, em afronta direta à decisão do Supremo.
Ao anular a deliberação do plenário, Alexandre de Moraes determinou que Hugo Motta declare a perda do mandato de Zambelli e dê posse ao suplente no prazo de 48 horas. Na decisão, o ministro afirmou que o ato da Câmara apresenta “evidente inconstitucionalidade, presentes tanto no desrespeito aos princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade, quanto flagrante desvio de finalidade”.
Moraes também foi enfático ao sustentar que a Câmara não tem competência para submeter esse tipo de decisão ao plenário. “Em respeito à Constituição Federal, é o Poder Judiciário quem determina a perda do mandato parlamentar condenado criminalmente com trânsito em julgado, cabendo à Mesa da Câmara dos Deputados, nos termos do §3º do artigo 55 da Constituição Federal, tão somente DECLARAR A PERDA DO MANDATO, ou seja, editar ato administrativo vinculado”, afirmou o ministro.
A decisão foi proferida de ofício, no âmbito da execução penal de Zambelli, sem que houvesse um pedido formal para que o Supremo se manifestasse sobre a votação da Câmara. O último movimento processual havia ocorrido no domingo (7), a partir de solicitação apresentada pela defesa da deputada. No despacho, Moraes cita reportagens sobre a deliberação do Legislativo, incluindo imagens do site oficial da Câmara.
O entendimento do ministro também projeta efeitos diretos sobre o caso do deputado Alexandre Ramagem. Condenado no processo relacionado à tentativa de golpe e igualmente fora do país, Ramagem teve o mandato considerado perdido pelo STF. Ainda assim, a cúpula da Câmara defendeu que o tema fosse submetido à votação do plenário, seguindo a mesma lógica aplicada a Zambelli.
Parlamentares avaliam que, se Hugo Motta recuar e cancelar a votação sobre Ramagem, enfrentará resistência de deputados alinhados ao bolsonarismo e abrirá precedente para a cassação automática de parlamentares condenados criminalmente. Por outro lado, manter a votação significaria desafiar uma diretriz já explicitada pelo Judiciário, ampliando o risco de atritos institucionais com o Supremo.
Além de agravar a situação interna da presidência da Câmara, a decisão de Moraes tende a reacender disputas históricas entre o Legislativo e o Judiciário. Deputados e senadores frequentemente criticam decisões do STF que colidem com deliberações do Congresso Nacional, cenário que agora volta ao centro do debate político em Brasília.
No mesmo despacho, Moraes solicitou ao ministro Flávio Dino, presidente da Primeira Turma do STF, a convocação de uma sessão em plenário virtual, das 11h às 18h desta sexta-feira (11), para análise do tema. A sessão foi confirmada cerca de uma hora depois, e a expectativa na Câmara é de que a decisão do relator seja referendada pelo colegiado, consolidando o entendimento do Supremo sobre a perda automática de mandatos em casos de condenação criminal definitiva.



